Edla Marinho

ESTAÇÃO SETEMBRO



 


Era o mês de primavera, dia da libertação
Desfiles...comemoração
Não mais vi, muito menos agora

O dia era de chuva
Lá fora, na calçada, tentativa de fugir....
Me iludir... Fingir
Debruçada numa fantasia:
Matar aquele dia

Tal como fora antes, a mesma comoção
Tudo do mesmo jeito, parece que o dilúvio se repetia
Tanto o sangrar do peito quanto o movimento daquele dia
Na varanda os mesmos assentos, quase num mesmo som, os lamentos...
Meus olhos afogados no pranto, a fitar o imenso vazio
Novamente minha vida sem acalanto
Tento não pensar... Não lembrar

Os pingos de chuva às lágrimas misturados
Parecia que o mundo havia parado
Olhava para o nada
O nada da rua...
O nada de gente que entrava e gente que saía
O nada em que eu me tornava, na calçada, jogada
Toda minha alma ali derramada...

Muitas vezes eu me vi fora de mim
E de fora do meu ser eu via minha fragilidade
Tentava recolher-me daquele chão
Mas não mandava na vontade

Lá dentro, na sala, tudo era flores
Por certo, batendo à porta, a primavera 
Não se importava com minhas dores
E com o inverno cinzento e frio
Que congelava todo o meu ser
Abrindo meu coração como da navalha o fio

Era mês de primavera
A sala repleta de flores
Nem sei de quantas cores
Alheias ao meu olhar perdido
Sem horizonte... Sem chão...
Perguntando a Deus se havia explicação
Para  se interromper aquela existência, tão de repente
Resposta calada... Inexistente.

Eu olhava...
Mal podia acreditar

Era novembro, muitos raios de sol

Quando ele viajou... 

As imagens se misturavam na lembrança

Ora ele, no sono eterno, ali jazia, como se voltasse
Ora ela, como a me olhar, tão presente
Diante do olhar de tanta gente

Essas lembranças vivem no meu agora
Tantos dias... Tantos meses, anos...
Meus versos, quase profanos
(Por causa dessa saudade
E o pranto que hoje me invade)
Pedem ao dono da vida o perdão
Por estar sangrando, de novo, o coração
Por reviver todo aquele sofrimento
Os meus piores momentos
A cruel e definitiva separação.


O tempo não passa, cada dia refaz
A saudade trespassa, de frente para trás
É infinito o sofrimento
Hoje, não menos que antes
A saudade é lancinante
Como foi naquele momento, que ainda aqui jaz
Sigo no caminho olhando para os lados
Em tola esperança
Voltar no tempo....
Novamente criança sem saber que teria um fado
Com refrão repetido, em dó (r)
Quando deixaram - me só
Na imensidão de dias dessa carência
Sigo como se estivesse inteira
Mas só o criador do universo
Sabe que me faltam dois pedaços, minhas rimas queridas
Para compor belos versos


Era novembro, muitos raios de sol
Menos de dez meses após
Num setembro florido
Ela o seguiu, fiquei, de vez, só
Abraçada à saudade
Até que na eternidade
Outra vez seremos nós
Unidos no amor
Curados da dor
Renovados... nova vida
Onde não haverá mais despedida

 

Edla Marinho

07/09/2020 

  • Autor: Edla Marinho (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 7 de Setembro de 2021 10:45
  • Comentário do autor sobre o poema: Hoje, tomada pela saudade de duas pessoas especiais que partiram muito cedo: Meu pai ( 62 anos), no dia 19 de novembro de 1996; Minha mãe (61 anos), no dia 07 de setembro de 1997, ou seja, apenas 9 meses e meio depois dele.
  • Categoria: Triste
  • Visualizações: 24

Comentários9

  • @(ND)

    Muito bom Edla... Vale pensar... Refletir...Tenha um dia de bençãos!

    • Edla Marinho

      Bom dia, amiga Neiva.
      Pois é, tem dias que fazem doer mais e a gente tenta versar bonito para um tema de dor.
      Mas a vida segue e teremos sempre as bênçãos que nos ajudam a sorrir.
      Grata pela leitura e comentário.
      Meu abraço.

    • Shmuel

      Nossa! Muito inspirado e sentidos versos. Parabéns por tanta poesia que te invade a alma.
      Bom dia, Edla Marinho!!

      • Edla Marinho

        Shimul, meu amigo, obrigada pelo comentário.
        Nem só de alegrias vive a poesia, não é?
        Linda noite pra ti!
        Meu abraço.

      • CORASSIS

        Lindo imortalizar entes queridos , parabéns !
        A saudade corroí, a as lembranças suavizam. abraço Edla .

        • Edla Marinho

          Verdade, Corassis, a gente sofre com a saudade mas as boas lembranças nos ajudam na caminhada.
          Grata por teu comentário.
          Excelente noite pra ti.
          Meu abraço.

        • Barbara Guimaraes

          Belíssimo poema! Muito comovente e de muita beleza dos seus versos embora tristes...

          • Edla Marinho

            Obrigada, Bárbara, por ler meu desabafo. É assim, a gente sofre com a saudade mas nos faz crescer, não é mesmo?
            Tenha uma feliz noite!
            Meu abraço.

          • Ema Machado

            As dores sentidas, transformam-se em doces poesias, ainda que sejam sofridas. Parabéns amiga!

            • Edla Marinho

              Sim, querida Ema, escrever é um jeito que a gente tem pra expor os sentimentos, inclusive os tristes, não é?
              Grata, querida, pelo comentário!
              Feliz noite, feliz quarta feira!
              Meu abraço

            • Helio Valim

              Olá, Edla. Bela homenagem e necessária catarse através da poesia.
              Um abraço

              • Edla Marinho

                Boa noite, Hélio, grata pela leitura e comentário.
                É assim a vida, com alegrias e tristezas. Mas tanto umas quanto outras nos moldam para sermos cada dia melhores, não é?
                Feliz noite e um belo despertar!
                Abraço

              • Hébron

                Muito bonito, Edla!

                • Edla Marinho

                  Grata, Hébron, pelo carinho da leitura e comentário!
                  Meu abraço.

                • Cecilia

                  Edla, Obrigada por nos confiar esse desabafo, em forma de poesia linda! Grande abraço crinhoso.

                • Edla Marinho

                  Boa tarde, Cecília.
                  Eu é que sou grata, querida, por ter o carinho dos amigos poetas que têm o coração sensível para receber as linhas tristes tanto quanto os versos de felicidade.
                  Tenha uma ótima noite, meu abraço!



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