Momento na rua Barão de Itapura

Cecilia

Momento na  rua Barão de Itapura

 

Foi nosso primeiro  avistamento.

 

Vínhamos, em direções opostas, pela varanda que rodeava as salas.  

O rapaz abaixou-se  para recuperar a caneta que derrubara. 

Eu me aproximava,  ele interrompeu o impulso de erguer-se. 

 

  Era como se houvesse  encontrado,  em minha face,

uma estrela, um código, um sinal,

que tornasse,  tudo o mais,  desnecessário e fútil. 

 

 Havia certa graça na situação.   Infantes,  brincávamos de estátuas?

 Não nos rimos,  a graça  era de outra natureza,

benção que  transcendia  tempos e  lugares.

 

   Sem desviar a vista, finalmente endireitou-se.   

Mas eu já ficara presa aos  seus olhos, àquela gravidade, àquela urgência.

´

  Um homem e uma mulher  se haviam descoberto e reconhecido, 

 nada mais importava  na face da terra.

 

Néscios que somos, acreditamos  abrir nossos caminhos, construr nosso fururo.

   

Uma caneta cai.   Ou não.   Um minuto antes.    Ou depois.

Tinha uma pedra no meio do caminho.   Tinha uma pedra...

Azrael passa, com pés de paina, nem um caule balança.

Mas o eixo do mundo se desloca para sempre.

  • Autor: Cecília Cosentino (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 7 de dezembro de 2020 10:56
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 25
Comentários +

Comentários8

  • Maria dorta

    Belo poema,nostálgico com toques futurista, e a vida é história vão nos levando de roldao! Aplausos!

    • Cecilia

      Obrigada, Maria. Por ler minhas memórias e opinar com tanta gentileza. Abraço

    • Hébron

      Poema que traz graciosidade em cada verso.
      Lindíssimo! Passa-se um filme suave e leve a quem lê!
      Abraço, poetisa

      • Cecilia

        Obrigada, Hébron. Suas palavras me ajudam sempre. Grande abraço

      • Edla Marinho

        Lindo!
        Eu fui lendo e minha mente foi retratando a cena, e me encantei.
        Beleza em poema!
        Abraço, amiga!

        • Cecilia

          Obrigada, Edla. Como é possível durar tanto uma emoção? Outro abraço, carinhoso.

        • Maximiliano Skol

          Querida Cecília, foi um sentimento de amor à primeira vista e relâmpago de 0,13 segundos, assim dizem. Igual Jacó ao
          encontrar os olhos de Raquel, ou sentimento de Rebeca ao avistar os olhos de Isaque.
          Azrael não poderia ter o seu ofício...
          Uma história de amor que se vez encantada pela maestria poética, toda sua.
          Parabéns.

          • Cecilia

            Maximiliano, como agradecer ? Sua apreciação me alegrou muito, você sabe ler nas entrelinhas...A história de Jacó e Raquel me impressiona, ainda sei decor os versos de Machado, minha caçula se chama Raquel... Abraço.

          • Ernane Bernardo

            Belo poema, poetisa Cecília, já havia um plano, um encontro casual?
            "... Uma caneta cai. Ou não. Um minuto antes. Ou depois.
            Tinha uma pedra no meio do caminho. Tinha uma pedra...
            Azrael passa, com pés de paina, nem um caule balança.
            Mas o eixo do mundo se desloca para sempre."

            Nostalgia de boas lembranças é uma terapia. Um forte abraço.

            • Cecilia

              Obrigada, Ernane. No fim do outono, o ofício é juntar lembranças, dar-lhes roupas novas...Abraço.

            • Claudia Casagrande

              Dona Cecília, quanto mais leio seus poemas, mais me encanto e agradeço muito por isso.
              beijos

              • Cecilia

                Obrigada, Cláudia. Eu é que me felicito e agradeço a você por estar conosco Beijo

              • Chico Lino

                Ainda é Natal de 2020, deu uma grande vontade de desejar a você todas as felicidades do mundo e fui surpreendido por.mais essa pérola, que mexe com o meu eixo... Felicidades, Cecília, obrigado por tudo... ah, Felizes Natais!...

              • Cecilia

                Obrigada por reaparecer, jé tinha saudas de você. E por opinar, seu parecer endossa outros, e me faz bem. Assusto-me, ao revisitar um episódio de 1955, e seus ecos ainda reverberarem...noutro século. Desejo a você e aos seus muitos Natais entremeados de dias felizes. Abraços



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