Francy Valente

O último suspiro


Aviso de ausência de Francy Valente
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O último suspiro

 

O sol ainda estava alto, quando, de repente, começou a escurecer... eu estava  andando pelo caminho empoeirado, tão cansada... sentia-me pesada, sem forças... e o dia escurecendo. Andava devagar, sentindo pedaços de mim ficarem pelo caminho. O fardo, pesado, desajeitado, causava dor e angústia. Eu queria desistir.

Após a curva, uma colina. E na colina, a avistei. Assombrosa, tenebrosa. Eram três, na verdade. Mas uma delas, a que estava no centro, me dizia algo mais... fixei meus olhos nela... Ele ainda estava vivo, mas seu sofrimento era notável... desviei meus olhos, tamanha dor causava-me o fato de vê-lo ali, sangrando.

Tentei seguir adiante. Talvez, não olhando, poderia esquecer-me da cena e, quem sabe, não pensar que tivesse alguma coisa a ver com isso. Mas eu já não conseguia encontrar o caminho, tal a escuridão que tomou conta do lugar. Então, voltei-me para ela... desta vez fixei os meus olhos nos d'Ele.. incrivelmente, Ele fixou os seus olhos em mim. E eu podia ouvi-lo, ainda que estivesse morrendo, como que sussurrando em meus ouvidos:

"Achegue-se... traga... o teu... fardo..."

Eu fui me achegando lentamente. Na medida em que me aproximava, era cada vez mais atraída. Então, em lágrimas, me lancei aos pés daquela cruz, abandonando o fardo ali mesmo e bradando em alta voz:

"Socorre-me!"

Ergui meus olhos, e a última coisa que pude ouvi-lo dizer foi: "Está consumado". Depois disso, expirou. Voltei-me em copiosas lágrimas para a terra, sem poder assimilar tão irreparável perda. Passei alguns instantes ali, quando então entendi que nada mais poderia ser feito... levantei-me arrasada, quando, espantada, olhei para os meus braços e vi, escrito com letras de sangue:

"de tal maneira, eu te amei..." 

O seu sangue me cobriu ali mesmo. Eram letras de vida.

Aquelas letras jamais foram apagadas, eu me tornei uma carta viva, um testemunho vivo da maior história de amor da humanidade! Sem que abrisse meus lábios, todo o meu ser ecoava palavras de vida.. E aquele fardo, pesado, ficou lá, aos pés da cruz! Os cacos foram levados ao oleiro, que refez o vaso.

Então, finalmente eu entendi: não era o último suspiro.

Era o primeiro.

  • Autor: Francy Valente (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 6 de Setembro de 2020 11:08
  • Comentário do autor sobre o poema: Minha base... Meu tudo!
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 46

Comentários4

  • Nelson de Medeiros

    Bom dia. Muito bom o teu conto.
    Parabens

    1 ab

  • Francy Valente

    Grata, Nelson. Abçs

  • CORASSIS

    Parabéns !
    Muito bom!
    Abraços.

  • Hébron

    Um texto sublime!
    Parabéns!
    Abraço, poetisa

    • Francy Valente

      Grata, Hébron!
      Abraços com rimas.



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