Pedro Castro

Clamor do poeta

 

Ah, pai, por que me fizeste poeta?

Minha tristeza me tira a alma e a vontade de ser,

O tempo é o mesmo de ontem e será o mesmo amanhã,

Os amores trazem encantos e cores tão vivas,

Que nada mais quero ver,

Nada mais quero sentir,

Contemplo o corpo do meu amor, como se visse a face de Deus,

Não só Deus, mas o que antecede a tudo,

E o beijo, ah o beijo é porta para o outro mundo,

No qual eu vivo e minha existência é enfim justificada.

 

Pai, por que me fizeste poeta?

Minha lágrima não tem o peso de uma simples lágrima,

Ela é a chuva, a maré e o mar para quem nunca viu,

Meu amor é pungente,

Amo espírito e a carne,

Os olhos e o corpo despido,

Mas nunca eu.

 

Pai, acordo sentimento pela manhã,

E a cor do sentimento é o que serena e destrói,

A paz? Nunca hei de encontrar,

Pois a espero junto da liberdade,

E a procura da liberdade é o que me mantém….

Vivo,

Toda essa agonia,

Todo esse desejo de plenitude,

Mas com a solidão sendo o chão disso tudo,

Pai, sou o grito, e o mundo diante a tudo é silêncio,

Me diz, como eu posso cantar?

Talvez a paz esteja escrita nos olhos do caos,

E eu não sei ler o que nunca vi,

Afinal, pra quem vive na guerra a paz nunca existiu.

 

 

 

Tentei amar com a convicção plena de que só o amor existe,

E quis voar e tocar o céu,

Beber o brilho das estrelas e senti-las queimar a minha língua,

Mas quando tentei, vi que não tinha asas, nem amor,

E as estrelas que tanto amei já estavam mortas,

Seu brilho era só a lembrança e o desejo do que não se pode ter,

Acreditei veementemente que o segredo da vida era a esperança,

E esperei, esperei, esperei,

A necessidade da verdade virou fome,

O amor passou, a chuva caiu, o sol secou a estrada fria,

E matou as flores do meu jardim,

E ainda acreditando,

Como quem prestes a morrer de fome e sem nada para comer,

Pedi a Deus esperança, ao invés de comida….

 

 

Pai, fizeste do vazio do céu, o meu peito,

Das sementes, o próprio fruto que não plantei e não colhi,

Do fato, a abstração que sinto e transformo em versos,

Da dor e agonia, o meu estado natural,

Da minha mãe, a santa que nunca pariu,

E por isso nasci com mais humanidade do que nenhum outro filho,

Por isso nasci sem história,

Sendo tudo e nada,

Sendo um,

Sendo aquele que mesmo pregando paz,

É pregado tendo como veredito um traidor.

 

 

Mas a verdade oculta dentre essas linhas, é o tempo,

Que sempre muda, nunca para e sempre passa,

O tempo nu e cru, que tira a vida,

A inocência de quem acredita que ainda tocará o céu,

A esperança do amor infinito,

E o coração de quem sente não como quem sente,

Mas como se fosse,

É assim que eu sinto,

E nada mais sentiria,

Se acaso a morte me encontrasse.

 

Se acaso a morte me encontrasse,

Meus sonhos morreriam comigo,

Seria eu, talvez, aquele que só poderia ter sido,

Meu amor, teria consigo para sempre, tudo que lhe doei e tudo que me doeu,

Seria então, o amor infinito,

Não haveriam Clarices para instigar a vida e explicar sua dor continua,

Os livros que nunca li permaneceriam na estante, sendo os mundos que nunca conheci,

Os caminhos que não tracei, seriam o retrato do medo tive de pisar no chão e desistir de tocar o céu, mesmo assim, seus destinos continuariam existindo,

Aos amores que não pude conhecer, tristes seriam, pois não haveria mais quem pudesse lhe mostrar que o amor é poesia,

A minha mãe, já não mais conheceria o riso e toda felicidade que os teus olhos poderiam sentir, seria rio,

As canções que não cantei,

Os sonhos que não sonhei,

Os amores que não amei,

As dores que não senti,

A vida que não vivi,

O tempo que não senti passar,

E por isso, a dor que não senti…

 

 

A vida,

Se perde em si mesma,

Ricos de espirito são os que se perdem nela,

Pois das mulheres, é a mais linda e incerta,

E a certeza de que o poeta é um fingidor,

Pai, já não mais a teria,

Se acaso a morte me encontrasse.

  • Autor: Pedro Castro (Offline Offline)
  • Publicado: 17 de Maio de 2023 09:04
  • Categoria: Reflexão
  • Visualizações: 14
  • Usuário favorito deste poema: Lia Graccho Dutra.

Comentários3

  • Sergio Neves

    SERGIO NEVES - ...com toda a humildade e respeito eu vou responder ao seu questionamento: -...ELE o fez poeta para que tu pudesse escrever grandiosidades poéticas como essa que aqui derramas...,...de uma intensidade pra ninguém botar defeito... /// Abcs.

  • CORASSIS

    Aplausos , escreveste uma obra prima !
    Abraços meu nobre .

  • Lia Graccho Dutra

    Muita sapiência e sensibilidade
    nos teus versos.
    Parabéns e palmas
    pra ti!

    Um abraço,
    Lia



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