estômago cheio de poesia.

Brunna Keila

Pouco se fala

sobre o estrago silencioso

de crescer sem um lugar onde a palavra pudesse pousar.

Na infância, a fala não tinha cadeira.

Na adolescência, a voz aprende a engasgar.

A tristeza vem sem nome,

e a vida, às vezes, parece não pedir permanência.

Eu passei por isso.

Houve dias em que quis fingir coragem,

dias em que o corpo pedia grito,

pular o chão, bater o pé,

deixar a culpa escorrer como chuva forte.

Mas aprendi cedo a conter o rio.

Há pessoas rasas 

não por maldade,

mas por nunca terem aprendido a mergulhar.

Isso não se aprende nos livros.

Aprende-se prestando atenção

no que dói quando ninguém vê.

Os adultos desejam que a adolescência

repita os costumes da casa,

como se a vida fosse herança engavetada.

Não percebem

o quanto a existência sem afeto

fica curta, estreita, cansada.

Há quem examine os que partiram desiludidos

como se fossem enigmas clínicos,

sem notar que carregavam dentro

um estômago cheio de poesia

não digerida,

não escutada.

Seguem encaixotando sonhos com cuidado técnico,

classificando paixões,

medindo sentimentos com régua fria.

Mas quem viveu sem amor

não deixou herança que sustentasse ninguém.

Ainda assim, dançaram sobre a memória 

uma dança dura,

sem música,

sobre o silêncio de quem só queria

ter sido ouvido.

  • Autor: Brunna Keila (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 30 de dezembro de 2025 17:01
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 3


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