Pouco se fala
sobre o estrago silencioso
de crescer sem um lugar onde a palavra pudesse pousar.
Na infância, a fala não tinha cadeira.
Na adolescência, a voz aprende a engasgar.
A tristeza vem sem nome,
e a vida, às vezes, parece não pedir permanência.
Eu passei por isso.
Houve dias em que quis fingir coragem,
dias em que o corpo pedia grito,
pular o chão, bater o pé,
deixar a culpa escorrer como chuva forte.
Mas aprendi cedo a conter o rio.
Há pessoas rasas
não por maldade,
mas por nunca terem aprendido a mergulhar.
Isso não se aprende nos livros.
Aprende-se prestando atenção
no que dói quando ninguém vê.
Os adultos desejam que a adolescência
repita os costumes da casa,
como se a vida fosse herança engavetada.
Não percebem
o quanto a existência sem afeto
fica curta, estreita, cansada.
Há quem examine os que partiram desiludidos
como se fossem enigmas clínicos,
sem notar que carregavam dentro
um estômago cheio de poesia
não digerida,
não escutada.
Seguem encaixotando sonhos com cuidado técnico,
classificando paixões,
medindo sentimentos com régua fria.
Mas quem viveu sem amor
não deixou herança que sustentasse ninguém.
Ainda assim, dançaram sobre a memória
uma dança dura,
sem música,
sobre o silêncio de quem só queria
ter sido ouvido.