ALVURA INÓSPITA
Fiz de tudo o que pude.
Jurei aos céus: vou lembrar sim.
Mas agora, com as sombras do meu ego e vaidade humana,
uma força que me faz repudiar o que não gosto,
se entorta na garganta,
e eu cuspo com nojo antes de engolir.
E agora, com as mãos sujas de nódoa,
de um veneno que me ensinaram a beber,
com a graça de quem exalta o que tem,
e ainda ri no fim.
Sabe, talvez o erro tenha sido meu:
acreditar que havia algo a salvar.
Mas a salvação é um mito.
O que me deram foi só uma tortura bem-feita,
uma prisão de pele e carne que, por um tempo,
pareceu ser liberdade.
E eu, tolo, brinquei no fio da navalha.
Hoje, não sou mais aquele que chamaria amor.
Sou o homem que se envenena só pra provar que está vivo,
porque sentir dor é mais digno do que viver anestesiado.
E é isso, digo com ironia:
a vida não é feita de finais felizes,
mas de amargas lições
que se disfarçam de paixão.
Agradeço, mas não quero mais esse presente.
Minha verdade é outra agora:
uma rara e inóspita indiferença.
E, de todas as redenções que tentei,
essa é a mais pura.
Se, por acaso, ainda guardarem resquícios de mim,
lembrem-se:
não sou mais o homem que alguns conheceram.
Sou o homem que aprendeu a se perder
sem esperança de encontrar algo em troca.
Afinal, qual é o prêmio por ter o coração espremido entre trapaças cruéis?
Perdi-me nos amores insanos,
nos olhares de fogo,
nos sorrisos que me mastigaram.
Não sabeis que o que me queima agora
não é o calor que um dia me abraçaram,
mas a frieza de quem sobreviveu
sem sequer precisar ser resgatado.
Eu? Agora sou só fumaça,
que se dissipa e some no ar.
E tudo o que sobrou foram lacunas
e perguntas que nunca encontram respostas,
mas que hoje deixaram de me consumir.
O desejo? É um canalha sem moralidade,
que às vezes vem, mas ignoro, e logo passa.
Pois desejar o mesmo carrasco
é ser refém dos sacrilégios indignos.
A saudade? É uma filha da puta.
Mas o que ficou de mim não tem preço.
E que me perdoem,
mas prefiro estar sem amor, sem calor,
do que na beira do abismo,
vendado, à espera do próximo empurrão.
Sempre odiei escolhas.
Mas se tiver que escolher,
prefiro continuar queimando,
ainda que seja por um fogo
que só eu entenda,
e que me faz sentir vivo.
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Autor:
C.araujo (Pseudónimo (
Offline) - Publicado: 12 de novembro de 2025 11:39
- Categoria: Não classificado
- Visualizações: 5
- Usuários favoritos deste poema: Melancolia...

Offline)
Comentários1
Capaz....
Cada dia nos alegra com esses teus poemas....
Sou seu fã;
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