ONDE A SAUDADE APRENDE A VIVER (Dedicado ao Dia de Finados)

Sezar Kosta

Há um instante em que o tempo se cala,

e o ar parece conter o eco de um nome.

A cadeira vazia, o prato intacto,

o rastro de um perfume no corredor —

é assim que o coração percebe

que algo partiu,

mas continua respirando no invisível.

 

No ruído da chaleira, há lembranças que fervem.

O vento dobra o lençol no varal,

como quem tenta cobrir um corpo ausente.

O relógio marca horas que não se repetem,

e ainda assim, cada minuto carrega

a presença de quem já não caminha,

mas ainda ocupa o espaço do pensamento.

 

A saudade, antes sombria,

aprendeu a vestir-se de aurora.

Já não é punhal, mas semente —

brota entre as frestas da perda,

transforma o silêncio em canção,

o pranto em orvalho que alimenta memórias.

O vazio floresce, inesperado,

como jardim que nasce das cinzas.

 

Descubro, então, que a morte é só mudança de morada,

um deslocar de essência,

um passo adiante no mapa do amor.

Não há fim, apenas transição:

quem se vai torna-se luz,

guia os passos de quem ficou,

e no encontro entre dor e beleza

nasce o verdadeiro significado do eterno.

 

Agora compreendo:

a saudade não é ausência, é continuação.

É o modo que o amor encontra

para permanecer tocando o que não pode tocar.

E quando o sol se inclina no horizonte,

sinto — com uma ternura que o tempo não apaga —

que não há morte onde existe lembrança,

nem adeus onde o amor ainda respira.

  • Autor: Sezar Kosta (Offline Offline)
  • Publicado: 2 de novembro de 2025 07:48
  • Comentário do autor sobre o poema: Não é a contagem dos calendários que define a vastidão de um afeto, mas a profundidade com que duas almas decidem se enlaçar. Vivemos o suficiente para tecer um laço com a força de um metal sagrado, invulnerável ao corte final. A morte tentou medir a nossa história com o seu tempo, mas descobriu que o nosso amor habita uma dimensão onde a eternidade é o único compasso.
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 8
  • Usuários favoritos deste poema: Sezar Kosta, Luana Santahelena, Arthur Santos
Comentários +

Comentários1

  • Arthur Santos

    Como dizia o Poetinha no soneto de fidelidade:

    Eu possa me dizer do amor (que tive):
    Que não seja imortal, posto que é chama
    Mas que seja infinito enquanto dure.

    Belo poema o seu Sezar



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