Relato de Uma Tentativa de Ser Gente Séria

Luana Santahelena

Acordei num sábado com a ideia firme:
hoje eu amadureço.
Separei roupa sem estampa,
li dois parágrafos de um livro cabeçudo
e joguei fora três paixonites mofadas.

 

No espelho, tentei fazer cara de adulta.
Mas minha franja rebelde riu de mim.

 

Fui ao mercado comprar quinoa,
mas acabei com sorvete, vinho e
um cacto que chamei de Epaminondas.

 

No meio da tentativa de almoço saudável,
queimei o arroz,
fiz miojo
e liguei pra minha mãe perguntando se ter planta conta como estabilidade emocional.

 

À tarde, organizei minhas metas
em um planner que só uso no dia da compra.
Assinei terapia, desassinei.
Dei like em frases motivacionais,
e chorei vendo desenho animado.

 

No fim do dia,
de pijama e purpurina do carnaval passado ainda na sobrancelha,
concluí:
se a maturidade quiser me encontrar,
que venha de chinelo e traga pizza.

  • Autor: Bulaxa Kebrada (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 16 de agosto de 2025 19:36
  • Comentário do autor sobre o poema: Crescer parece um plano simples até esbarrar no espelho, no arroz queimado ou nas decisões impulsivas do mercado. Tentamos controlar o caos com planners, frases bonitas e cactos batizados, mas a vida insiste em ser bagunçada e doce ao mesmo tempo. No fim, talvez amadurecer seja aceitar que estamos sempre em obra, com glitter do passado e esperança de pizza no futuro.
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 54
  • Usuários favoritos deste poema: Luana Santahelena, Sezar Kosta, JT., Versos Discretos
Comentários +

Comentários4

  • Sezar Kosta

    O tempo, Luana, tem essas ironias. A gente passa a vida inteira tentando ser "gente séria" e, quando chega a hora, descobre que é a franja rebelde que nos salva. A vida nos oferece a quinoa, a roupa sem estampa e os livros cabeçudos, como se a felicidade fosse uma matéria de estudo. E a gente, na nossa humana e bendita imperfeição, acaba preferindo o sorvete e o vinho, esses pequenos atos de subversão.

    O que é, afinal, a maturidade, senão a capacidade de rir de si mesmo? É um caminho sem GPS, sem planner e sem frases motivacionais. Ela não vem, ela já está. E se a gente for procurá-la, que seja de chinelo, com o cheiro de pizza no ar, e a certeza de que a melhor lição da vida é poder chorar de alegria vendo um desenho animado.

  • JT.

    Me apeguei a ir ao cinema, mas quando acordei.
    Chupava sorvete de pistache.
    Com o PC ligado no site.
    Adorando por ler o seu poema.
    JT

  • Edla Marinho

    Gostei de como abordou esse tema
    Amadurecer , às vezes, requer um deixar de lado coisas simples, talvez não tão saudáveis e não encucar demais, não é?
    Sorvetes e pizzas podem não ser o melhor pra saúde mas dá um prazer enorme,rs
    Amei, meu abraço!

  • Minha Caixa de Pandora

    Que poema delicioso!! É uma joia de sensibilidade e humor. Parabéns poetisa, seu poema não apenas diverte, ele acolhe. É impossível não se identificar.



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