Vazia, oca e despedaçada?

Carolina Alves


Aviso de ausência de Carolina Alves
Minhas palavras aparecem só quando a dor se cala no silêncio do peito e o que sinto transborda sem aviso.
Agora, preciso de um tempo para cuidar de mim, para que meu coração encontre descanso e meu espírito possa se reerguer.
Esse é meu espaço de pausa, um momento íntimo onde me recolho, esperando que a poesia volte a nascer, sincera e verdadeira, como sempre foi.
Volto quando sentir que as palavras são a única forma de dizer o que não consigo explicar.
Obrigada por estar aqui, pela paciência e pelo carinho. Até breve ☺️❤️

Me via sempre me procurando em olhos alheios,

buscando amor, carinho, admiração...

Mas nunca me encontrei.

 

Quando olhava os olhos de terceiros, me via.

E o que refletia era sempre o pior de mim:

triste, vazio, oco, oco, oco… Um interminável vazio.

 

Ouvi dizer que não há felicidade sem respeito próprio.

Mas como respeitar quem nunca conheci de fato?

Como respeitar a figura que sempre olhei, odiei,

culpei, maltratei, quebrei?

 

Quebrada ao ponto de só existir vazio,

cinzas, máscaras e oco, oco, oco…

 

Sou o cão que, sendo eletrocutado, maltratado,

permanece estagnado…

Vazio, cinza, oco, quebrado, despedaçado, dilacerado.

E o pior? O carcereiro, a pessoa atroz por trás das correntes,

sou eu mesma.

 

“Você é o juiz da sua própria vida”, disseram-me.

Mas como pode um juiz ser tão benevolente com os outros

e, ao julgar a si mesmo,

sentenciar apenas à morte,

à extinção,

sem perdão?

 

Dizem: “Você é o arquiteto do seu futuro.”

Mas, quando é para construir e auxiliar o futuro de alguém,

o arquiteto ergue monumentos, palacetes,

dedica sua alma ao projeto do outro.

Quando é para si…

não há tinta, nem papel, nem criatividade.

Para si, qualquer barraca ou tenda basta.

 

Cadê a grandeza do arquiteto que projetou castelos para outros?

Cadê a paixão, a devoção, a lealdade do arquiteto?

Cadê o amor?

 

Mas…

E se o juiz olhasse para si com os mesmos olhos de clemência?

Se o arquiteto soubesse que também merece um castelo?

Se o carcereiro soltasse as correntes?

Se o cão ferido aprendesse a caminhar para longe da dor?

 

E se, por um instante — apenas um —

eu me olhasse como olho o outro,

e visse que, sob o oco, o vazio, a cinza,

há alguém que ainda pulsa,

ainda sonha,

ainda pode existir?

 

Um dia, ouvi que a felicidade não bate à porta…

Mas e se, por um momento — só um momento —

em meio ao desespero, à dor, ao sofrimento e à melancolia,

eu arrombasse a porta?

 

E começasse a caçar a felicidade,

com a selvageria e a fome de alguém desesperado, partido, rachado?

Corresse pelo mundo cinza e desconhecido,

lutando, desejando, buscando…

 

E se, enquanto estivesse à procura,

eu olhasse além da paisagem?

Tirasse o foco da árvore cinza, quebrada, despedaçada…

E visse o bosque ao redor, e a semente germinando,

encontrando seu caminho sob o sol,

desafiando o preto e branco da paisagem com seu verde magnífico?

 

E se, enquanto corro atrás da felicidade,

eu visse o nascer do sol,

desafiando o mundo apagado com suas paletas de cores?

 

E se eu sentisse o vento e a chuva,

lembrando de quando eu não tinha medo de sentir?

De quando olhar, perguntar e admirar faziam parte do meu existir?

 

E se eu percebesse que o mundo nunca foi preto e branco?

Que as cores sempre estiveram ali,

apagadas apenas pela dor e sofrimento?

 

E se, apenas por um instante,

eu me permitisse sentir?

Deixar que o vento preenchesse o vazio e o oco do meu ser…

Que a chuva lavasse os cacos colecionados na minha alma?

E se eu aprendesse a correr,

livre das correntes que me prendem no limbo da dor e do vazio?

 

E se a minha fome de felicidade se transformasse em sede de vida?

 

E se, apesar das dores e cicatrizes,

ainda houvesse um coração que pulsa,

deseja, busca…

Um corpo que insiste em respirar, gritar, chorar…

Uma alma que, enfraquecida, abandonada e esquecida, ainda resiste?

 

E se, por fim, eu percebesse que a felicidade nunca esteve perdida…

Apenas esperando que eu abrisse os olhos…

Esperando que eu me olhasse como um dia admirei o mundo do outro?

  • Autor: Lina (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 8 de julho de 2025 01:22
  • Comentário do autor sobre o poema: Esse poema nasceu de um exercício profundo e desconfortável que a vida me propôs — ou melhor, que minha psicóloga me propôs. Ela me pediu que eu lesse o livro “Apaixone-se por Si Mesmo”, de Walter Riso, e foi impossível não me identificar, não me enxergar nas páginas e metáforas daquele livro. Enquanto lia, me peguei refletindo sobre o quanto eu me maltratei, me negligenciei e me abandonei ao longo dos anos. A metáfora do cachorro que, mesmo sendo maltratado, permanece estagnado e acostumado à dor ficou martelando na minha cabeça. Foi aí que o poema aconteceu. Ele não foi escrito por vontade consciente, mas por necessidade — como se tudo o que eu sentia, reprimia e fingia ignorar escorresse pelas palavras sem controle. Minha psicóloga me pediu para ler o poema para ela… e foi visceral. Falar aquelas palavras em voz alta me atravessou de um jeito que nem eu, que as escrevi, estava preparada. Chorei. Chorei pelo que escrevi, pela dor que estava ali, pela verdade crua que carrego e pela possibilidade de, talvez, um dia, olhar para mim com o mesmo carinho que sempre ofereci aos outros. Esse poema é, ao mesmo tempo, um grito, um desabafo e um ponto de partida. É o reflexo da dor de quem, por tanto tempo, só soube se quebrar… Mas que, ainda assim, sonha em se reconstruir. Com a terapia, descobri algo importante sobre mim: não sou boa em falar sobre meus sentimentos… Mas sou ótima em despejá-los, explicá-los e explorá-los em forma de versos. É escrevendo que me ouço. É na poesia que me entendo.
  • Categoria: Triste
  • Visualizações: 5


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