não te prometo que a dor vá embora —
ela tem chave da casa,
entra sem bater,
deita no canto onde teu riso se guardava.
mas eu posso ficar.
sem urgência,
sem receita.
posso ser brisa no teu cansaço,
escuta no grito do mundo,
caminho firme quando o chão some.
a dor, às vezes, é como orvalho
que insiste, mesmo após o sol nascer —
e tudo bem.
há beleza no que insiste com leveza.
não ofereço cura,
mas ofereço colo:
esse abrigo que não explica,
mas entende.
não apago cicatrizes,
mas beijo cada uma
como quem as lê com os dedos.
em mim, mora um silêncio que te acolhe,
e um afeto que cresce
como flor que nasce no asfalto rachado.
fica.
ou deixa que eu fique,
enquanto tua dor respira —
e eu, com ela.
até que um dia,
sem que se perceba,
ela se despeça em paz.
-
Autor:
Sezar Kosta (
Offline)
- Publicado: 15 de maio de 2025 19:16
- Comentário do autor sobre o poema: Sabe aquelas dores que não pedem licença, entram, largam o chinelo na porta e se jogam no sofá da alma como se a casa fosse delas? Pois é… uma dessas resolveu passar um tempo aqui. Eu só tinha duas opções: mandar embora ou fazer um café. Fiz o café. E, enquanto ela falava pouco e pesava muito, fui escrevendo. O poema nasceu desse chá de silêncio, desse colo sem manual. É curioso como algumas dores, quando escutadas com gentileza, começam a arrumar suas malas devagar... até se despedirem em paz. Me conta aí nos comentários: qual parte desse poema tocou um cantinho seu?
- Categoria: Não classificado
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- Usuários favoritos deste poema: Sezar Kosta, Melancolia...
Comentários4
Bem sutil seu poema, já me peguei com uma dor durante 1 ano, uma dor de cabeça antes de travar meu lado esquerdo, fiz até um poema a respeito da dor que também não é eterna. Gostei do seu poema. Parabéns poeta.
"A gente sabe que a dor não some assim, num passe de mágica. Ela é teimosa, grudenta, faz parte do pacote "ser humano". Então, não vou prometer conto de fadas. Mas prometo estar por perto, sem aquela ansiedade de "e aí, já passou?". Vou respeitar o tempo de fossa, de silêncio, de choro sem culpa. Se o mundo virar as costas, vai poder se encostar aqui. Não tenho as palavras certas, mas tenho colo. O amor não é varinha de condão, mas é um baita abraço. E fico. Fico até sentir que o nó desatou um pouquinho, que a respiração ficou mais leve." Sezar Kosta
Fico com o coração aquecido de saber que essas palavras chegaram até aí. Que tua caminhada seja acompanhada de afetos teimosos, daqueles que ficam, mesmo quando tudo o mais parece ir embora.
Ler esse poema é como receber um abraço que não promete soluções, mas permanece — e, às vezes, é exatamente disso que a gente precisa: de alguém que fique, mesmo quando a dor se recusa a ir embora.
A imagem da dor com chave da casa é de uma honestidade brutal, e ainda assim, você a envolve com ternura. Porque sim, algumas dores não saem com receita nem oração, mas podem ser suavizadas com presença — essa presença que o poema oferece com tanta generosidade.
“Há beleza no que insiste com leveza” é daquelas frases que a gente quer tatuar na memória. E o final… tão sutil e humano. O tipo de consolo que não força a partida da dor, mas caminha com ela até que ela se vá — se quiser.
Olha só meu amigo Melancolia, a dor é que nem cebola, sabe? A gente vai descascando, chorando um bocado, e às vezes parece que não acaba nunca. Prometer que ela vai sumir é como prometer que não vai ter engarrafamento na sexta-feira. Impossível. Mas a gente pode sentar junto na mesa, tomar um café, enquanto você descasca essa cebola. Sem pressa, sem palpite furado. Se a coisa ficar braba, eu lavo a louça. Não tenho a receita pra felicidade instantânea, mas tenho ombro pra encostar. O amor? Sei lá, talvez seja só não deixar o outro sozinho na cozinha quando a cebola tá atacando. E fico por aqui. Até a ardência passar um pouco.
Assim, meu caro amigo, este poema nos convida a repensar a forma como nos aproximamos da dor alheia. Ele nos sussurra que, muitas vezes, a cura não reside em soluções rápidas, mas na beleza profunda do "estar junto", na dança compassiva dos corações que se reconhecem em sua humanidade compartilhada. Que possamos levar essa lição lírica para nossos encontros, cultivando a arte da presença amorosa em cada passo de nossa jornada.
Com muita alegria recebo o seu carinho! Fico feliz que o texto tenha sussurrado algo tão bonito aí dentro. Que a vida te presenteie com dias macios, como abraço que dura mais um segundo do que o esperado.
És admirável ...
Abraços e aguardo o café quentinho com a cebola....
Hou meu caríssimo Poeta
Creio que tocou todos os cantos
Do meu sofá, da minha casa, da minha vida...
Parabéns por tão bem a descrever,
Saudações amigo
Que legal sua percepção! É como se a gente tivesse visto a mesma estrela cadente e feito um pedido parecido. Que seus sonhos voem alto e a serenidade seja sua constante companheira.
Saudações minha amiga!
Todas as estrofes de teu poema tocaram fundo em meu coração,poeta! Você decerto com sua magia,entrou e alumiou todos os vais escuros de meu interior. Aplausos de pé!
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