"O preço do amor"

simone carvalho dos Santos

 

Recebeste em silêncio o calor do meu colo...

Nas noites sem sono, eu vesti tua dor...

Meus braços foram teu primeiro consolo...

E minha vida, teu mapa de amor.

 

Dei-te o tempo que o mundo não dava...

Fiz do meu peito abrigo e guarida...

Com lágrimas minhas tua febre baixava...

Cada cuidado, uma parte da vida.

 

Mas eis que o tempo virou o espelho...

E os dias dourados se foram no chão...

Agora cansada, suplico um conselho:

Preciso pagar-te por um coração?

 

Se não há salário, não há gentileza...

Se não tem valor, não sobra afeto...

Sou só tua mãe — sem mais nobreza,

Na velhice, teu olhar ficou discreto.

 

Ah, filha querida, onde está tua alma?

Trocastes o amor por um contrato frio?

Esqueceste da fonte, da estrada, da calma,

Do leite ofertado nos dias vazios.

 

Talvez um dia o mundo te ensine,

Que afeto comprado tem prazo a vencer.

E quem vende o tempo por um “me convine...”

Não sabe o que é realmente viver.

  • Autor: Simone Carvalho (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 12 de maio de 2025 14:49
  • Comentário do autor sobre o poema: O amor não deveria ter preço.
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 11
  • Usuários favoritos deste poema: Melancolia..., Sezar Kosta
Comentários +

Comentários3

  • Melancolia...

    Este poema é um grito silencioso de uma mãe ferida pelo esquecimento da filha — uma voz suave, mas carregada de dor e desilusão. Ele retrata a doação incondicional do amor materno, contrastando com a frieza de um retorno marcado por ingratidão e distanciamento emocional.

    A mãe, que um dia foi abrigo e remédio, agora se vê reduzida a uma presença incômoda, invisível diante da lógica utilitária do afeto moderno. O verso "Preciso pagar-te por um coração?" resume com crueza a inversão dos papéis: de cuidadora a devedora de amor. A crítica à mercantilização dos vínculos — ao “contrato frio” — revela não só a dor pessoal, mas também uma reflexão social sobre o abandono afetivo na velhice.

    É um poema que toca fundo, não só por seu lirismo, mas por sua verdade cotidiana. Ele nos convida a pensar: como temos retribuído o amor que recebemos de quem mais nos deu?

  • Rosangela Rodrigues de Oliveira

    Nossa muito lindo e profundo seu poema. Parabéns poetisa. Boa noite.

  • Sezar Kosta

    Oi, Simone! Seu poema é um soco doce no peito — daqueles que deixam a gente com um nó na garganta e a alma em silêncio por uns minutos. A forma como você transforma a dor de uma mãe em poesia é de uma beleza dolorida, mas profundamente verdadeira.

    A relação entre mãe e filha aqui aparece como um campo de batalha entre o amor incondicional e a frieza do tempo, dos valores modernos, das trocas que nunca deveriam existir. Foi sua intenção revelar essa dor silenciosa, que muitas vezes é calada por vergonha ou resignação? Porque você fez isso com uma dignidade emocionante.

    A metáfora que me veio é a de uma árvore antiga que ofertou todos os seus frutos e sombra — mas, agora, esquecida, continua ali, firme, esperando apenas um olhar de volta.

    E me lembrei de uma frase de Lya Luft que parece casar com sua mensagem:
    “Amor não se cobra, amor se vive. Mas o abandono também tem um preço.”

    Parabéns por dar voz a tantas mães que amaram em silêncio e hoje vivem nas entrelinhas da saudade. Que sua escrita continue sendo esse eco de verdades que o mundo tanto precisa ouvir.



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