O Velho Ambrósio e o Destino
Lá no sertão esquecido,
Onde o vento faz a curva,
Vivia um velho sabido,
Mas de saudade que turva.
Seu nome era Ambrósio, o forte,
Mas a vida lhe deu um corte.
Casado com dona Anália,
Mulher firme e destemida,
Criaram oito meninas,
Cada qual bem resolvida.
Mas a morte traiçoeira,
Levou embora a parceira.
Desde então, o velho triste
Vivia só no ranchinho,
As filhas em seus destinos,
Cada qual com seu caminho.
E ele, ali no terreiro,
Remendando o seu roteiro.
O Dilema na Cozinha
Certa tarde, distraído,
Foi mexer na panelada,
Feijão já borbulhando,
Com a lenha bem queimada.
Mas então, veio um sussurro,
Trazendo um frio no murro.
— Ambrósio, homem teimoso,
Que que tu tá a fazer?
Isso nunca foi teu forte,
Vai queimar sem perceber!
Tá cozendo ou cozinhando?
Ou tá só a se perder?
O velho gelou na hora,
Sentiu a espinha tremer.
Olhou pra trás, arrepiado,
Mas não viu ninguém ali.
Só o vento lá de fora,
E a voz que insistia a sair
— Oxente, Anália, mulher,
Tá querendo me azucrinar?
Se é coser ou cozinhar,
Não precisa me amarrar!
Se é do pano ou da panela,
Não precisa me gritar!
A voz riu, tão dengosa,
Como fazia em seu tempo.
— Toda vida foi teimoso,
E hoje segue sem talento!
Pega a linha e a farinha,
E vê se acerta o intento!
— Mulher, mas se eu misturo,
O feijão e o caldo inteiro,
E junto um pouco de linha,
Não se cose por inteiro?
Me explica direito, Anália,
Que eu sou velho, mas ligeiro!
E a voz riu mais uma vez,
Com doçura e com carinho:
— Coser é coisa de linha,
Cozinhar é do teu vinho!
Se botar agulha no tacho,
Vai engasgar o vizinho!
As Filhas e o Recado
Lá distante, em suas casas,
As filhas sentiram o vento.
A mais velha, costureira,
Parou no exato momento.
— Pai tá ouvindo mamãe,
Isso é coisa de sentimento!
A segunda, professora,
Fez questão de corrigir:
— Pai, coser é de costura,
Cozinhar é pra ingerir!
Não se aprende na saudade,
Mas no verbo de insistir!
A terceira, lá no fogão,
Mexia doce e rapadura.
Ao saber do ocorrido,
Soltou logo com ternura:
— Se costurar o feijão,
Vai comer só costura!
As outras riram baixinho,
Sabendo bem da verdade.
— Papai tá meio doido,
Ou sentindo é só saudade!
Mamãe nunca foi de sumir,
Nem na tal eternidade!
E mandaram um bilhete,
Escrito de coração:
— Pai, mamãe segue contigo,
Lá no céu ou no fogão.
Mas deixa de teimosia,
E aprende a lição!
O Desfecho
Ambrósio leu o recado,
E sorriu bem devagar.
Riu sozinho lá no rancho,
E sentiu o peito esquentar.
— Anália, mulher danada,
Nem morta deixa de mandar!
Desde então, decidiu bem,
Sem querer mais confusão:
Costurava só a rede,
E mexia só no feijão.
Pois quando o amor é forte,
Nem a morte põe no chão!
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Autor:
Tainá Lopes (
Offline)
- Publicado: 29 de abril de 2025 23:24
- Comentário do autor sobre o poema: Tentando um novo estilo de escrita hahaha.
- Categoria: Conto
- Visualizações: 6
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Comentários1
Que lindo! Você tem o dom estampado!
Seus pais devem ter o maior orgulho do
mundo de ti.
Sua escrita tem essência, arte e beleza.
Parabéns nobre escritora.
Abraço minha poetisa.
Meu querido, agradeço as palavras de carinho. Eu sempre procuro deixar o meu legado em cada pessoa. Agradeço por tanta consideração ??
Beijos e abraços da sua poetisa ????
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