O ACENDEDOR DO DIA

joaquim cesario de mello

 

Vou desligar a noite

e acender a luz da manhã

no escutar do vozear dos pardais

no imo dos tímpanos dos meus ouvidos

 

No cochilar residual da cidade

o silêncio ainda exala resíduos noturnos

logo varridos pelo caminhão do lixo

que atrasado chega para o serviço

enquanto espanto os monstros de volta

ao interior dos armários de onde

vou retirar minha melhor roupagem

e me encobrir de azul claro amarelado

como se eu fosse a aurora do dia

 

Aos poucos que nem uma aranha

o nascer da alvorada vai tecendo sua teia

no entrançar dos fios madrugados

para capturar os futuros acordados

na trama dos dramas nossos de cada dia

 

Quem sou para avisar os até agora dormentes

que a noite já se foi carregando consigo os sonhos

e que o Sol nos espera no abrasar suarento

neste verão estufado e calorento à beira-mar  

deste imenso Oceano Atlântico nordestino?

 

No espreguiçar das pálpebras

sou eu quem acendo o dia

 

  • Autor: joaquim cesario de mello (Offline Offline)
  • Publicado: 16 de abril de 2024 07:32
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 8
  • Usuários favoritos deste poema: verenavini
Comentários +

Comentários1

  • Jose Rinaldo Pinheiro Leal

    Isso sim é um poeta!
    Recebi o seu livro meu caro!
    Agradeço o carinho.
    Vou aprecia-lo do começo ao fim, saborear cada verso e aprender a escrever poema como você.
    Obrigado!
    abraços.

    • joaquim cesario de mello

      Caro Rinaldo
      Quem muito me abriu os olhos para o verdadeiro ofício de poeta foi Rainer Maria Rilke, que li ainda bastante jovem. Este poeta de língua alemã (de nascimento austríaco), cuja obra tem uma intensidade lírica ímpar, tem um livro, que sugiro a todos lerem, titulado Cartas a Um Jovem Poeta (obra póstuma). Nele comecei a compreender ver a vida em toda sua simplicidade complexa.
      Trechos como os abaixo, fizeram-me mudar a forma de olhar das minhas retinas:
      “Escave dentro de si uma resposta profunda. Se for afirmativa, se puder contestar àquela pergunta severa por um forte e simples “sou”, então construa a sua vida de acordo com esta necessidade. Sua vida, até em sua hora mais indiferente e anódina, deverá tornar-se o sinal e o testemunho de tal pressão. Aproxime-se então da natureza. Depois procure, como se fosse o primeiro homem, dizer o que vê, vive, ama e perde”
      “Utilize, para se exprimir, as coisas do seu ambiente, as imagens dos seus sonhos e os objetos de sua lembrança. Se a própria existência cotidiana lhe parecer pobre, não a acuse. Acuse a si mesmo, diga consigo que não é bastante poeta para extrair as suas riquezas. Para o criador, com efeito, não há pobreza nem lugar mesquinho e indiferente. Mesmo que se encontrasse numa prisão, cujas paredes impedissem todos os ruídos do mundo de chegar aos seus ouvidos, não lhe ficaria sempre sua infância, esta esplêndida e régia riqueza, esse tesouro de recordações?”
      Eis, sim, uma leitura reveladora



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