Que destino terão meus livros
quando minhas mãos não mais os manusearem?
Quem decodificará minha alma formada
no interior folhoso das brochuras
e dos calhamaços empilhados nas estantes
ou por cima das escrivaninhas
távolas, mesas e bancadas da casa
Livros são feitos de mudezes que falam
no instante em que a quietude das letras caladas
é exposta aos olhos bisbilhoteiros
que esfomeados de espantos
buscam no esfolhear desnudante
os segredos embutidos na vida
que habitam a imensidão cósmica
dos deuses, de Delfos e do Universo
Para onde irão meus diversos Fernandos Pessoas
e por quais mares nunca dantes navegados
irão singrar Moby Dick, Camões e a Odisseia
edição capa dura de 1974?
Quem herdará meus livros fechados
por onde percorri milênios de histórias
lutei em Cartago
cavalguei com Quixote
atravessei buracos seguindo coelhos
segui o mapa e achei o tesouro
passei férias no Sítio do Picapau Amarelo
conheci o retrato de Dorian Grey
descobri o Horizonte Perdido
e como Bandeira fui também amigo de rei
E esse tanto de letras?
E essa abundância de palavras?
E essa enxurrada de ideias?
E esses véus rasgados?
E esses sonhos acordados?
E essa vida vista do outro lado?
E as incontáveis noites em claro
que passava lendo durante a madrugada
como se vivesse em uma Babilônia encantada?
(Quem ficará com minha face
logo após abrirem o meu inventário?)
Um dia me tornarei cinzas
como pó que o tempo acrescenta
às legendas escritas nas lombadas
- Autor: joaquim cesario de mello ( Offline)
- Publicado: 17 de maio de 2023 08:35
- Categoria: Não classificado
- Visualizações: 23
- Usuários favoritos deste poema: SANTO VANDINHO
Comentários5
SERGIO NEVES - ...meu amigo, mataste a pau na escrira desse tema...,...disseste tudo e mais alguma coisa...,...ao terminar a leitura eu me senti como se tivesse lido um livro,...um ótimo livro! // ...alguém por aí já disse: ..."...somos o resultado dos livros que lemos...",...talvez isso possa ser um certo exagero, mas, que a frase é bonita, isso é... /// Abçs.
Sabe, Sérgio, também temos, dialeticamente, o outro lado. Certa vez alguém também já disse que \"minha cultura são os livros que não li\". Abraços, e obrigado pela leitura e compartilhamento.
"Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada"
Assim disse Álvaro de Campos
no pessimista poema Tabacaria.
Outros no futuro terão ideias de outros livros em detrimento do sentimentos atuais... José Saramago falou, no Roda Viva, a frase que o Sérgio Neves repetiu: "somos os livros que lemos."
"(Quem ficará com minha face
logo após abrirem o meu inventário?)"
Seu poema é, admiravelmente, futurista.
Um forte braço, prezado Joaquim de Mello.
Bom dia, Joaquim!
Desejo que tenha vida longa,
felicidade
e boa saúde.
Os seus livros fazem
parte do seu patrimônio.
Logo quando você
partir, eles ficarão
para os seus herdeiros.
Mas se eles
não tiverem
interesse
em recebê-los,
eu quero à sua biblioteca!
Abraço,
Lia
Obrigado, Lia. Bom saber que se pode ter herdeiros.
Um abraço
Joaquim
Reflexivo e linda mensagem ! "Os meus Livros já estão por esse mundão a fora e quiçá nas memórias Universais das vidas Infinitas ! rsrsrsrsr Paz e Bem Poeta !
Valeu, Vandinho. Obrigado pela leitura
Leitura valiosa,desvendando nosso "outro lado"...apego/ desapego. Livros são tesouros para mim,valem mais que diamante ou ouro.Leio para aprender desde sempre,mas alguns livros são para serem degustados,como um bom vinho, outros para serem em.parte, engolidos e deixados de lado. Alguns poucos para serem mastigados e digeridos. Esses se incorporam ao nosso eu interior, nos enriquecem.
Um dia sem leitura,para mim, é um dia perdido. Compreendo todo teu apreço pelos teus livros. Eles nos enriquecem,complementam. Livros...meus melhores amigos.
Meus aplausos de pé!
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