Eu só conto os degraus abaixo

Antonio Luiz

Eu já vivi mais de 20800 dias, completos. Foram dezenas de aniversários, e eu me lembro de quase todos, até de quando havia bolo com velinhas. De uns tempos para cá, as memórias das datas festivas vêm assentadas, uma a uma, nos patamares de uma longa escada. Nela, eu observo o meu substrato se espalhando em anagrama, em alma e lama. O primeiro, com propensão natural a subir, célere e freneticamente; o segundo, a descer espessamente, manchando a escada. Em vão, eu tento rememorar os primeiros patamares, das velas sopradas no colo de meus pais. No máximo, tenho evitado enlamear degraus mais recentes. Até gostaria de desacelerar o tempo em algum patamar, aproveitando mais os sorrisos próximos, mas a minha alma me puxa. Parece estar ansiosa pelo meu dia incompleto, o derradeiro, em que largará minha mão. Oxalá seja num dos 364 dias de espelho, pois não pretendo tombar num patamar, cercado por inúmeras velas, as quais eu já não possa assoprar.

  • Autor: Antonio Luiz (Offline Offline)
  • Publicado: 25 de abril de 2023 11:45
  • Comentário do autor sobre o poema: Uma pequena reflexão, em forma de (um ensaio de) prosa poética, motivada pela proximidade de meu quinquagésimo sétimo aniversário!
  • Categoria: Reflexão
  • Visualizações: 12


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