Eu já vivi mais de 20800 dias, completos. Foram dezenas de aniversários, e eu me lembro de quase todos, até de quando havia bolo com velinhas. De uns tempos para cá, as memórias das datas festivas vêm assentadas, uma a uma, nos patamares de uma longa escada. Nela, eu observo o meu substrato se espalhando em anagrama, em alma e lama. O primeiro, com propensão natural a subir, célere e freneticamente; o segundo, a descer espessamente, manchando a escada. Em vão, eu tento rememorar os primeiros patamares, das velas sopradas no colo de meus pais. No máximo, tenho evitado enlamear degraus mais recentes. Até gostaria de desacelerar o tempo em algum patamar, aproveitando mais os sorrisos próximos, mas a minha alma me puxa. Parece estar ansiosa pelo meu dia incompleto, o derradeiro, em que largará minha mão. Oxalá seja num dos 364 dias de espelho, pois não pretendo tombar num patamar, cercado por inúmeras velas, as quais eu já não possa assoprar.