Arlindo@123

Tricofagia

Tricofagia

É outono; a copa nua do arvoredo

Fidamente me remete à uma lembrança

Por possuir harmoniosa semelhança

Com a essência visual do meu segredo!

 

Pra entenderem a memória resguardada

E o porquê à comparei distintamente

Com uma fronde pelo outono desfolhada

Devo a tratar pelo viés de um doente!

 

Sofregamente dominante, a condição

Me pregnava da cabeça aos tornozelos

E à maneira de uma prensa em ação

Eu arrancava e deglutia meus cabelos!

 

Me comparava à um ilustre lavrador

Que na labuta meritória e corriqueira

Vai arrancando das gramíneas a toiceira

Para depois encaminha-la ao moedor!

 

A compulsão tem o poder de satanás,

A mesma força opressora do tinhoso

Que entre a dura obsessão do falso gozo

Nos leva sempre a querer cada vez mais..

 

Em meio à vômitos e dores excessivas

Um desconforto estomacal angustiante,

A condição e suas forças criativas

Me impeliram à um estágio horripilante!

 

E foi então que comecei a cobiçar

Num silêncio friamente monstruoso

Entre sombras de um anseio desejoso

Da minha esposa todo adorno capilar!

 

Aquela idéia em meu ser recrudescia

Então um dia, não podendo suportá-la

Logrando ver que minha amada já dormia

Fui contra ela e comecei esfaqueá-la!

 

Nove facadas, foram nove exatamente,

(Só um detalhe que em suma não importa)

Porém o ataque não foi muito eficiente

A infeliz estava queda, mas não morta!

 

Sua agonia impeliu o meu intento;

Ao seu ouvido exigi perdão por tudo,

E na ação de um transtorno violento

Pousei mordidas no seu couro cabeludo!

 

E que olor! À cada vez que mastigava

A ruiva ruma de pelúcia muito espessa!

E foi assim, até pelar toda cabeça

Da criatura que inda viva agonizava!

 

Tempo depois vendo que havia sucumbido,

Deixei-a calva numa poça de abandono

E hoje vendo o arvoredo assaz despido

Vejo que à ela fiz as vezes de um outono!

Moreira Júnior
 
  • Autor: Moreira Júnior (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 28 de Dezembro de 2022 00:01
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 11

Comentários2

  • DAN GUSTAVO

    Esses estranhos prazeres... e de quebra uma terrivelmente poética confissão!rs Temos aqui mais uma demonstração de seu apetite inusitado e um tanto mórbido, mas sem perder a poesia!rs Só espero que não tenha sido como os 'fiapos de manga' que geralmente ficam presos na garganta e... pãtz!rs Um bom dia e bom começo de Ano, Moreira!

  • Arlindo@123

    Obrigado Mestre, tudo de bom pra você e sua família!



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