Ema Machado

O troco


Aviso de ausência de Ema Machado
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O troco

Ema Machado

 

O momento não passava, permanecia estático. Mesmo que quisesse, ainda não poderia entrar na capela. Ficaria ali, parada como o tempo até o momento exato…

Tudo pronto, o maior sonho de Alexia estava próximo de se concretizar. Radiante, dava um toque nos arranjos da festa, afinal, nada poderia dar errado. O buffet elegante, vestido dos sonhos, amigos íntimos e a viagem de núpcias... 

Sentada na limousine,  observava os convidados chegarem. Tudo parecia perfeito, não fosse o cenário ridículo que presenciara há poucos dias. Não estaria ali, como agora.

Arthur, o homem perfeito, poderia ser seu, se quisesse. Ou não? Poderia revidar a ofensa por vê-lo tripudiar de seus sentimentos, enquanto conversava com sua amante de quinta categoria. 

Riram dela descaradamente. Diziam que nada mudaria após o casamento, “apenas teriam mais dinheiro para gastar em seus prazeres”. 

Não iria estragar o prazer de decepcioná-los… Iria, até o último momento…

Descobriu estar grávida, por isso anteciparam o casamento. Nem sequer imaginava, ser apenas uma peça valiosa para Arthur. Não mais importava, ele receberia o prêmio merecido.

Tudo aconteceu muito rápido. Alexia sentia precisar de um tempo, sozinha. Decidiu fazer uma pequena viagem antes dos preparativos do casamento. Resolveu ir até à casa dos pais, moravam no interior de São Paulo e o ar do campo lhe faria bem. Infelizmente, um passeio a cavalo fez com que ela perdesse o bebê. Era de fato o que mais sentia…

Voltou decidida a contar a perda a Arthur e o faria. Porém, como estava carente, quis fazer-lhe uma surpresa voltando antes do previsto. A surpresa foi dela, encontraria o futuro marido nos braços da secretária. Nunca os perdoaria.

Eles não perceberam sua chegada. Alexia entrou devagarinho para surpreender o noivo. Após ouvi-los arquitetar ideias sórdidas, deu meia volta e saiu como chegou, sem ser vista.

Ela era uma executiva bem sucedida, herdara a firma de cosméticos da avó paterna. Era rica, linda e nunca lhe faltaram pretendentes. 

Quanto a Arthur, era apenas gerente em uma loja de departamentos. Conheceram-se em uma reunião de negócios. Alexia nunca se importou com o fato do futuro marido não ter dinheiro, ela tinha suficiente para ambos.

Da limousine, viu quando ele chegou. Era bonito e estava impecável no terno que ela lhe comprara. Viu quando todos os convidados chegaram, ninguém percebeu a figura negra sentada no carro de luxo. 

Ela estava linda vestida de negro, o vestido longo e apertado, marcava-lhe o corpo esguio. Colocara luvas e véu sob um pequeno arranjo de flores negras. Aguardou até a chegada da secretária do noivo, e, decididamente desceu do carro…

A marcha tocada, surpreendeu a todos. Ao contrário da música nupcial, uma música fúnebre ecoou na capela. Alexia adentrou no longo corredor enfeitado das mais belas flores. O espanto tomou conta de todos, nunca viram uma noiva tão linda em trajes de luto.

Arthur não entendia tudo aquilo, pensava ser apenas um capricho da noiva, e, ela estava linda… 

Andava devagar, próximo ao altar, ele adiantou-se  para recebê-la, ergueu o véu negro que lhe cobria a face… A gargalhada soou alta e clara… Ela ria, ria tanto que ele pensou que ela havia enlouquecido.

Desvencilhando de Arthur, Alexia pegou o microfone que estava próximo e anunciou:

_ Meus queridos, convidados! Vocês são testemunhas de um enterro. Acabamos de enterrar um sonho! O fruto do meu sonho, enterrei há quinze dias. O amor há dois dias, em um escritório, logo após meu retorno. Não haverá,  casamento! -  Não lamentem! Como no México, haverá festa após esta cena fúnebre. 

Ele não disse nada; não havia o que dizer.  Apenas saiu de cena, enquanto Alexia gargalhava satisfeita.  



 




 

  • Autor: Ema Machado (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 7 de Julho de 2022 19:38
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 23
  • Usuário favorito deste poema: jazzy.

Comentários3

  • Maria dorta

    Uau! Que imaginação! Parece filme mexicano. Bela e macabra vingança. Aplausos!

  • jazzy

    Nossa me perdi imaginando essa cena.

  • Antonio Olivio

    Quando comecei a ler não parei nem pra respirar...!
    Um conto muito bem escrito !!
    Parabéns Ema!!



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