Memória Fúnebre

Julia Vasconcelos

algum dia, não quero ser lembrada só como uma pessoa que sofre, ou que sofreu.

não quero que apenas lembrem da depressão, da minha fragilidade

das peças que a vida me pregou

das mortes que eu tive antes da última

dos cigarros, dos remédios e da bebida

dos choros constantes 

do meu isolamento

das lacerações

na alma e no meu corpo

dos abusos

acho importante lembrar

e reforçar o ódio e repúdio a esse sistema de atrocidades

mas gostaria que se possível, lembrassem de algo a mais

da minha doçura

que não se amargava facilmente assim

dos meus sorrisos

fáceis e sinceros 

da sensibilidade ao sentir

ao toque e a todo resto 

da meu senso de justiça incansável

da garra colocada em luta

da minha paciência comigo e com os outros, que foi fruto de muita resistência a um ciclo feroz de impanciências

que assim como raízes, eram profundas e estiveram desde o início.

que lembrem dos olhos que brilhavam com crianças, animais, com elogios e com o pôr do sol

que lembrem de que em vários momentos desatentos tentei esquecer, apagar

ou que tentaram

não esqueçam do meu amor

revolucionário, fiel e singelo

modesto e sincero amor.

  • Autor: Julia Vasconcelos (Offline Offline)
  • Publicado: 3 de junho de 2022 01:59
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 18
Comentários +

Comentários2

  • Pedro Garrão

    Bravo. Adorei essa parte "da minha doçura que não se amargava facilmente".

    • Drica

      Realmente essa parte é muito transparente. Lindo poema!

    • Pedro Garrão

      Bravo. Adorei essa parte "da minha doçura que não se amargava facilmente".



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