Pedro Trajano de Araujo

A Besta Fera

Justino filho único de Severino

Desde seus tempos de menino

Ouvia as histórias de seu pai

Contadas por seus vizinhos.

“Cabra macho da peste! Diziam eles

Arrancava o coro das serpentes

Matava abelhas com os dentes...”

 

Mas dos feitos que o povo contava

Um era o preferido de Justino

Sem dúvida o que ele mais gostava

Era ouvir sobre o casal de feras

Que andava por estas terras

Uma delas seu pai matou

Rezava a lenda que a outra escapou.

 

O rapaz na coragem

Estava longe de seu pai:

—Eu quero é ser um matuto valente!

Esbravejava Justino eloquente.

Terezinha sua mãe lhe olhava torto

E ia logo dizendo: — Quieta moleque!

Não quero ver meu filho morto!

 

Certa vez já com dezoito

Justino se achando moço,

Arrumou uma namorada

Rosinha, menina nova.

Um botão de flor juvenil

Querendo desabrochar

Fez o rapaz se encorajar

 

Um dia ele recebeu um bilhete

O recado de Rosinha dizia:

     “ Vem conhecer meu pai

Pedir minha mão será preciso “

Caboclo novo e apaixonado

Acreditando ser corajoso,

Justino ficou esperançoso.

 

Rosinha morava distante

Os caçadores não gostavam da estrada

Diziam que o caminho que levava

À fazenda Toca da Onça

Tinha um trecho perigoso

Achavam que por lá andava

A fera que de Severino escapara

 

Justino foi firme

Respondendo a sua mãe:

—Sou filho de Severino

 Homem o bastante

Para atravessar aquela terra,

Se for preciso para ver Rosinha

Até enfrento a outra fera.

 

O dia de visitar Rosinha foi marcado

Severino saiu cedo, antes do sol se por

Chegou ao anoitecer na casa da amada

De longe avistou a flor bela e encantada

Coração bateu em disparada

Era preciso convencer o pai da moça

A deixar rosinha ser sua namorada

 

Raimundo, o matador de onça

Apertando forte a mão de Justino

Foi logo lhe dizendo:

—Rapaz de seu pai conheço a fama

Se honras a tua descendência

Podemos parar com esta audiência

Podes namorar Rosinha.... Com prudência!”

 

O rapaz estava empolgado

Mas era preciso voltar para casa

Queria chegar antes da madrugada

Cronometrou o tempo de vir

Sabia exato o tempo de partir

Então olhando o relógio

Levantou e pôs-se a se despedir

 

Mal saíra da fazenda Toca da Onça

A lua cheia que estava escondida

Apareceu e, pôs-se a clarear o caminho

O silencio da noite foi quebrado

Pelo piá de uma velha coruja

O que deixou Justino desconcertado

Mal agouro, pensou amedrontado.

 

Já há três quartos de casa

Coração de Justino quase saiu pela boca

Assim que fez uma curva na estrada

Foi pior do que ver alma penada

De baixo da sombra de uma sete copa

Um enorme monstro ele avistou

“Seria a fera que de meu pai escapou?”

 

O medo lhe paralisou até a espinha

Hora o bicho aquietava, ora se mexia

Voltar para casa de Rosinha não podia

Como explicar para Raimundo

Que o “valente” filho de Severino

Diante de uma fera não teve culhões?

Mas ele, encarar a besta? Nem por mil milhões!

 

O relógio marcou duas da manhã

Justino então tomou a decisão

Apertar na espora o velho pangaré

Faltava lhe coragem, mais tinha fé

O plano era ganhar impulso

Para saltar por cima da fera

E se não desse certo, ele já era...

 

Traçou na testa o sinal da cruz

Pediu proteção a Jesus

Segurou firme nas rédeas

Com a espora cutucou o animal

Fazendo cocega em sua virilha

Justino queria sair saltando

Mas o animal saiu foi trotando

 

Saltar a fera o rapaz estava sonhando

Justino passou mesmo foi galopando

Descobriu que o monstro que vira

Era na verdade a luz da lua cheia

Passando pelas folhas da sete copas

O medo se dissipou e ele se sentiu aliviado

 Enquanto percebia o fundo da calça melado...

 

Pedro Trajano

Penápolis SP

  • Autor: Trajano (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 15 de Outubro de 2021 16:11
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 18

Comentários3

  • Hébron

    Meu amigo, que prazeroso conto em versos, demonstrando a grande criatividade e habilidade do poeta.
    Muito bom mesmo!
    Abraço

  • Shmuel

    Realmente muito bom! O final é impagável.kkk
    Abraços ao poeta Pedro Trajando de Araújo.

  • Altofe

    Belo cordel em septilhas e com um ótimo desfecho. Parabéns. Abs.



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