Justino filho único de Severino
Desde seus tempos de menino
Ouvia as histórias de seu pai
Contadas por seus vizinhos.
“Cabra macho da peste! Diziam eles
Arrancava o coro das serpentes
Matava abelhas com os dentes...”
Mas dos feitos que o povo contava
Um era o preferido de Justino
Sem dúvida o que ele mais gostava
Era ouvir sobre o casal de feras
Que andava por estas terras
Uma delas seu pai matou
Rezava a lenda que a outra escapou.
O rapaz na coragem
Estava longe de seu pai:
—Eu quero é ser um matuto valente!
Esbravejava Justino eloquente.
Terezinha sua mãe lhe olhava torto
E ia logo dizendo: — Quieta moleque!
Não quero ver meu filho morto!
Certa vez já com dezoito
Justino se achando moço,
Arrumou uma namorada
Rosinha, menina nova.
Um botão de flor juvenil
Querendo desabrochar
Fez o rapaz se encorajar
Um dia ele recebeu um bilhete
O recado de Rosinha dizia:
“ Vem conhecer meu pai
Pedir minha mão será preciso “
Caboclo novo e apaixonado
Acreditando ser corajoso,
Justino ficou esperançoso.
Rosinha morava distante
Os caçadores não gostavam da estrada
Diziam que o caminho que levava
À fazenda Toca da Onça
Tinha um trecho perigoso
Achavam que por lá andava
A fera que de Severino escapara
Justino foi firme
Respondendo a sua mãe:
—Sou filho de Severino
Homem o bastante
Para atravessar aquela terra,
Se for preciso para ver Rosinha
Até enfrento a outra fera.
O dia de visitar Rosinha foi marcado
Severino saiu cedo, antes do sol se por
Chegou ao anoitecer na casa da amada
De longe avistou a flor bela e encantada
Coração bateu em disparada
Era preciso convencer o pai da moça
A deixar rosinha ser sua namorada
Raimundo, o matador de onça
Apertando forte a mão de Justino
Foi logo lhe dizendo:
—Rapaz de seu pai conheço a fama
Se honras a tua descendência
Podemos parar com esta audiência
Podes namorar Rosinha.... Com prudência!”
O rapaz estava empolgado
Mas era preciso voltar para casa
Queria chegar antes da madrugada
Cronometrou o tempo de vir
Sabia exato o tempo de partir
Então olhando o relógio
Levantou e pôs-se a se despedir
Mal saíra da fazenda Toca da Onça
A lua cheia que estava escondida
Apareceu e, pôs-se a clarear o caminho
O silencio da noite foi quebrado
Pelo piá de uma velha coruja
O que deixou Justino desconcertado
Mal agouro, pensou amedrontado.
Já há três quartos de casa
Coração de Justino quase saiu pela boca
Assim que fez uma curva na estrada
Foi pior do que ver alma penada
De baixo da sombra de uma sete copa
Um enorme monstro ele avistou
“Seria a fera que de meu pai escapou?”
O medo lhe paralisou até a espinha
Hora o bicho aquietava, ora se mexia
Voltar para casa de Rosinha não podia
Como explicar para Raimundo
Que o “valente” filho de Severino
Diante de uma fera não teve culhões?
Mas ele, encarar a besta? Nem por mil milhões!
O relógio marcou duas da manhã
Justino então tomou a decisão
Apertar na espora o velho pangaré
Faltava lhe coragem, mais tinha fé
O plano era ganhar impulso
Para saltar por cima da fera
E se não desse certo, ele já era...
Traçou na testa o sinal da cruz
Pediu proteção a Jesus
Segurou firme nas rédeas
Com a espora cutucou o animal
Fazendo cocega em sua virilha
Justino queria sair saltando
Mas o animal saiu foi trotando
Saltar a fera o rapaz estava sonhando
Justino passou mesmo foi galopando
Descobriu que o monstro que vira
Era na verdade a luz da lua cheia
Passando pelas folhas da sete copas
O medo se dissipou e ele se sentiu aliviado
Enquanto percebia o fundo da calça melado...
Pedro Trajano
Penápolis SP