Quando eu deito minha face 
No travesseiro macio
Luz apagada
Nada se vê
Apenas meu coração dispara
E pergunto a Deus "Por quê?"
Ele deve me achar ingrata
Ou talvez veja melhor do que eu
E me perdoe o desatino
De imaginar outras faces
Dormindo sobre pedras
Sobre cimentos frios
Crianças tão pequeninas
Sem um teto aconchegante para protegê-las
Eu peço a Deus dignidade
Para todo ser humano
Peço coragem para olhar a realidade
Peço força para não agradecer
Por ter algo que o meu semelhante não tenha
Deus sabe que não sou ingrata
Mas não posso saborear uma boa comida
Sem imaginar que há pessoas iguais a mim que morrem
Morrem de fome numa Terra tão rica
Eu não vou agradecer por enxergar
Enquanto outros não enxergam.
Eu desejo é que todos vejam!
Por que eu deveria agradecer por ter algo
Que o meu semelhante não tem?
Eu peço a Deus: Abra os nossos sentimentos, Senhor!
Não nos deixeis cair na tentação
De achar que seremos felizes e ricos
Enquanto a maioria de nós
Mal sobrevive na Terra.
Arrancai-nos, Senhor, de tal hipocrisia
De faminta discórdia entre os nossos
De tenebrosa indiferença
De tão impiedosa ausência
De algum senso de moral
Perdoai-nos, Senhor, pois ainda julgamos 
Que há melhores e piores entre nós
Que há fracassados e bem-sucedidos
Que há herança para aqueles que mal sabem cuidar de si
Que há destino prometido sobre nossa voz.
Dai-nos, Senhor, o pão nosso de cada dia
O amor
A atenção verdadeira
O tempo 
A dedicação inteira
A gente
O pertencer, figueira
Dai-nos a garra de recriar um mundo
Um mundo digno para todos nós!