Em S. Paulo, no Cibus Restaurante, depois de ser servido, o garçom lhe perguntou: “Posso me sentar ao lado?–Como não?–Eu o conheço de algum lugar. Ou foi num sonho que o senhor terá sido meu pai... Não sei... Esse sonho permaneceu em mim, tanto intenso como se o fora ontem, quanto vívida é a sua lembrança. Sileno, surpreso com tão insólito inportuno, retrucou:
–Esqueça, meu rapaz. Deve ser outro. Nunca fui pai de alguém. Como não me é lícito tirar uma vida pelo assassínio, renego-me o direito de procriar uma vida que não me concedeu licença para tal.
– Por isso mesmo é que eu me atrevo a falar-lhe desse sonho.
–Quer saber de uma coisa? Traga-me a conta. Vou-me embora. O garçom obedeceu-lhe calado, embora, prestimoso. Sileno retirou-se do Restaurante, sem olhar para trás e rápido, no seu carro, como se a fugir de algo que temia. “Será que a mulher me trapaceou e não seguiu com o procedimento abortivo?” Ele tinha pago, antecipadamente,o ato cirúrgico...Contudo, por seu turno, nunca se certificou que o aborto estivera consumado. Por outro lado, também, a mulher nunca mais o vira... Voltou no dia seguinte para redimir-se do pensamento intruso, que o garçom intrometido lhe resgatou da memória. Acomodou-se no mesmo local da mesa e pensou:”sujeito atrevido querer ‘sentar-se ao meu lado’. Que lucro tem esse sujeito em simular retorno de um passado defunto?” Achegou-lhe o dono do Restaurante a servir-lhe.
– O garçom de ontem não está?
– Não, meu senhor.
– Algum motivo de saúde?
–Não sabemos coisa alguma desse jovem. Ofereceu-se pelo anúncio, na entrada, minutos antes de o senhor, aqui, chegar e demonstrou aparente experiência no trabalho. Aceitei-o. Estava desesperado por um auxiliar. O outro está de férias.
– Onde se encontra ele agora?
–Não sei, meu senhor.
–Não justificou o motivo da ausência?
–Desapareceu sorrateiro num sumiço inexplicável, assim que o senhor retirou-se. Aliàs, o senhor teve o privilégio de ser o primeiro e o último freguês a quem ele prestou serviço.Acho que não se agradou do nosso ambiente. Pereceu-me muito tímido ao ponto de não ousar a dar satisfações pela sua saída. –Ele se me apresentou estranho de olhar pétreo e com gestos de movimentos como sob ação de zero gravidade. –Não deu tempo para lhe perceber essas coisas...Aqui o cardápio, esteja à vontade.
–Perdi o apetite...Prefiro uma dose dupla do seu melhor uísque. –Só me resta o Passport de versão brasileira. Não é de boa qualidade.
–Que pena! No momento o Ghost & Rare me seria o mais apropriado.–Ah, meu amigo, o único local onde se pode degustar, por enquanto, desse “Uísque Fantasma” seria no Bar do Cofre SubAstor, no Farol Santander, no centro da cidade.– Que venha o Passport, embora, todos nós teremos ‘o passaporte’ para algum lugar em outra dimensão, contudo,o seu regresso é o que eu estou temendo.
– Mais outra dose?
–Pensando bem, quero retirar-me e beber o Ghost & Rare no Farol Santander.
–Que não lhe falte o Uísque Fantasma, meu senhor. –Que não me venha um garçom fantasma, isto sim.
–O mundo surreal pertence aos mortos, meu prezado, e àqueles que se embriagam além de uma saudade ou de um remorso.
Uma batida extra, do coração do Sileno, sacudiu-lhe o tórax provocando- lhe um surto de tosse como se a exorcizar a afirmação do homem que lhe veio num feitio de uma sentença.
–Desgraça, resmungou, quero o Farol Santander.
No painel do carro, eram 22 horas.
- Autor: Maximiliano Skol (Pseudónimo ( Offline)
- Publicado: 23 de abril de 2021 21:29
- Comentário do autor sobre o poema: Johnnie Walker Blue Label Ghost and Rare feito com uísques insubstituíveis de um número de destilarias “Ghost” icônicas, que fecharam há muitos anos, 1985. Daí o nome “uísque fantasma e raro” (ghost & rare). São uísques excepcionalmente raros das reservas limitadas do Johnnie Walker Blue Label. Nota: Garçom com ‘M’ é o certo na língua portuguesa, com ‘N’ será estrangeirismo para o Francês.
- Categoria: Não classificado
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- Usuários favoritos deste poema: Poesia, Eu Sou iamai
Comentários2
Bom demais. Se este garçon não for sobrenatural, espero o reencontro para esclarecimento da paternidade, tchê. Baita abraço.
Prendeu-me a leitura.
Continua... continua...
Please!!
???
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