Catarse Intima (Capitulo III)

Tales Vieira

chega não quero mais te ouvir tampo os ouvidos mas não adianta suas vozes continuam causando ecos dentro deste quarto abandonado e você o que fez até agora lhe pergunto voz que me aterroriza e faz do despertar um pesadelo hoje tranco a escuridão do lado de fora da janela é uma tempestade que se apodera da cidade não há ninguém andando nas ruas hoje mas o barulho continua porque uma das mulheres que passou por esta calçada se trancou em outro quarto escuro para chorar debruçada em suas mãos na sua cama bagunçada com os cabelos soltos cobrindo o seu rosto e de tanto chorar ela tombou no chão desmaiada e quem ouviu todos nós ouvimos não havia música nas ruas o ruído era a nova sinfonia a insônia uma sonata macabra e as palavras algo que se ouvia atentamente à distância  mas ela não ouviu o som da própria voz enquanto gritava por socorro no dia anterior quando as portas se fecharam e o seu corpo se desfazia diante do espelho e parecia estar andando por cima de um vácuo contínuo onde cada passo te aproxima mais da queda ah se alguém te avisasse à tempo que faltavam apenas dois passos sua voz ecoou por toda a rua em um tom agudo de pavor  mas eu te ouvi e agora estou confuso demais para falar o ventilador gira para um lado e então gira para o outro o relógio parou de rodar ao meio dia e foi exatamente no momento em que parou de chover mas o tempo continuava nublado e as ruas continuavam desertas os restaurantes estavam abertos mas ninguém ocupava as mesas os garçons em silêncio os donos em silêncio os vendedores em silêncio e a sua voz silenciada pelo desamparo.

 

espere eu ainda preciso dizer algumas coisas em relação à garota do quarto ao lado que gritou em prantos fazendo com que sua voz em perpétua agonia pudesse ecoar pelas ruas sendo assim consegui ouvir ao atravessar a passarela do metrô cruzando a Q... e adentrando um prédio ao lado

assim como também consegui ouvir ao acordar duas horas depois do grito que continuava a ecoar então me levantei correndo em direção à janela mas o tempo estava apenas nublado  e o asfalto já estava seco logo eu não sabia de nada

mas eu sabia porque durante a tempestade precisei me encolher ao lado de uma loja espremida com dois vendendores em silêncio eles olhavam para o chão e para algum lugar distante do local onde estávamos naquele momento

eu que me posicionava com meus filhos em frente à janela fechada encolhidos pelo frio da noite anterior pois havíamos adormecido com a janela aberta estávamos em silêncio quando a garota do grito de perpétua agonia gritou e permanecemos diante da janela até mesmo quando o eco cessou dois dias depois

eu ouvi o grito quando a B... acordou  rindo  então ela cobriu o seu corpo com uma toalha verde enquanto eu apanhei no chão uma folha em branco e uma caneta preta antes de procurar pelas suas roupas ao redor do quarto até que estávamos arrumados e prontos para permanecer diante da janela fechada durante dois dias sem dizer sequer uma palavra.

  • Autor: Tales Vieira (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 20 de abril de 2021 06:39
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 21


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