No alto berço de vapor e fúria, eu nasci,
Entre o rugido do trovão e o clarão que cega.
Eu era nuvem, era um todo, eu não era eu,
Até que o peso da existência me disse: “Navega.”
Senti o frio da separação, o tremor do adeus,
O ventre cinzento do céu me expulsou com violência.
E ali, no abismo do ar, ganhei minha forma,
Uma esfera de cristal, pura e sem consciência.
Ah, a queda! A vertigem gloriosa do despencar!
O vento cortando meu corpo, gritando segredos.
Não é assim a juventude? Um salto no escuro,
Sem saber onde pousar, mas caindo sem medos.
Eu vi o mundo lá embaixo, um mosaico de verdes e marrons,
Tão vasto, tão duro, esperando meu beijo fatal.
Pensei que morreria ao tocar o solo bruto,
Mas descobri que o fim do eu é o começo do real.
Estalei na folha, tremi na rocha, deslizei na terra,
E ali perdi meu nome, minha forma singular.
Encontrei outras mil, perdidas como eu,
E juntas, no barro, aprendemos a caminhar.
Fizemos do caos um riacho, da união uma força,
Assim como o amor que funde duas almas em uma.
Já não era gota, era fluxo, era espuma e correnteza,
Levando pedras, vencendo a seca, rompendo a bruma.
Desci montanhas, ralei-me em cascalhos de dor,
Fui remanso de paz em tardes de sol dourado.
Vi rostos beberem de mim, vi raízes me sugarem,
Fui vida para outros, fui o sacro e o profano misturado.
E o rio cresceu, tornou-se velho, sábio e lento,
Carregando as mágoas da margem e o lodo da história.
Senti o cheiro de sal ao longe, um chamado antigo,
A promessa de um fim que não é morte, mas glória.
Diante de mim, o Oceano! O Grande Pai Azul!
O horizonte infinito onde o tempo se desfaz.
Tive medo? Sim. Pois ali eu deixaria de ser rio,
Para me tornar a imensidão, o caos e a paz.
Mergulhei no salgado abraço, e o “eu” sumiu,
Mas nada se perdeu, tudo se transformou.
Pois a vida é isso: cair do céu, correr na terra,
E voltar ao mar profundo de onde o amor brotou.
Agora sou onda, sou maré, sou o todo enfim,
Esperando o Sol me erguer para cair outra vez.
Não chore a queda, nem tema o impacto no chão,
Pois viver é a arte de fluir na imensidão.
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Autor:
Bardo de Ferro (Pseudónimo (
Offline) - Publicado: 2 de dezembro de 2025 19:24
- Comentário do autor sobre o poema: Uma visão da vida pelo olhar de algo tão pequeno e puro, uma gota de chuva. Seu ciclo de vida refletindo como o tempo e brutal e rapido
- Categoria: Reflexão
- Visualizações: 4
- Usuários favoritos deste poema: Aira Lirien

Offline)
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