quase eu, quase paz

jovi

não sei se to aqui.

ou se tô quase.

ou se tô… não importa.

 

parece quieto,

mas a quietude se mexe,

como se respirasse por conta própria.

fico parado,

acho,

ou talvez só tenha esquecido de me mover?

 

tudo parece longe.

não, perto demais.

não…

não sei.

 

as vezes penso que to prestes a entender alguma coisa,

uma linha,

um fio,

um sinal,

mas a ideia derrete antes de tomar forma

e escorre pelo canto da minha mente

como lágrimas na chuva.

 

tento segurar,

mas minhas mãos falham,

ou talvez seja a ideia que nunca existiu.

 

é paz?

não parece.

talvez pareça.

talvez eu só tenha esquecido como é sentir isso?

 

respiro devagar.

acho que é devagar.

não sinto direito.

talvez eu esteja respirando demais,

ou de menos,

ou só repetindo a mesma respiração esperando que algo mude nela,

mas nada muda,

e isso me confunde mais.

 

as vezes fico olhando pro nada

até o nada começar a olhar de volta.

ele olha.

eu olho.

ninguém desvia.

tem uma conversa acontecendo ali,

e eu não entendo nenhuma palavra.

 

tudo parece um eco sem som.

ou um som sem eco.

ou só um eco de um eco de um eco

de algo que nunca disse.

 

me pego tentando lembrar por que mesmo eu queria paz,

e a resposta vem em pedaços quebrados,

igual vidro pisado,

“porque…”,

“talvez…”,

“se eu…”,

mas os pedaços não encaixam.

 

as vezes sinto um peso leve demais pra ser real,

uma calma que escorrega pelos cantos,

que se desfaz quando tento olhar de frente,

como se a paz tivesse vergonha

de ser vista de perto.

 

e eu,

eu fico repetindo mentalmente

“tá tudo bem”,

“tá tudo bem”,

“tá tudo-”,

até a frase perder o sentido,

até virar só um som sem dono,

até eu esquecer o que “bem” significa.

 

tem horas em que tudo fica branco,

não de luz,

mas de ausência,

como se alguém tivesse apagado as bordas das coisas.

fico ali,

sem bordas,

sem direção,

tentando não cair num lugar que nem existe.

 

e no meio disso tudo,

essa paz…

essa coisa…

esse intervalo esquisito…

fica encostada no meu ombro

como se me conhecesse,

como se me aceitasse,

como se fizesse “shhh”,

mas o murmúrio dela incomoda,

e acalma,

e machuca,

e embala,

tudo ao mesmo tempo.

 

acho que tô bem.

acho que não tô.

acho que tanto faz.

 

as vezes penso que to voltando pra mim,

mas ai lembro que nem sei onde fiquei pela última vez.

 

tudo se repete.

ou talvez nada se repita?

 

so sei que continuo aqui,

ou quase aqui,

ou quase eu,

abraçado nessa paz que não encaixa em lugar nenhum,

tentando não desmanchar antes de entender

se ela me salva

ou só me cala.

  • Autor: jovi (Offline Offline)
  • Publicado: 23 de novembro de 2025 00:41
  • Comentário do autor sobre o poema: esse poema é meu jeitinho estranho de admitir que a paz que eu procuro e a que eu finjo ter não são a mesma coisa. escrevi tentando entender esse silêncio que parece acalmar, mas no fundo, só esconde o que eu não consigo encarar. é um retrato da confusão que fica quando eu tento me convencer de que estou bem, mesmo sabendo que algo dentro de mim ainda treme.
  • Categoria: Reflexão
  • Visualizações: 7


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