Minha primeira vez vivendo

Magz

Olhando meu boletim vermelho,

penso no quanto tudo isso é injusto.

“Mas essa é a minha primeira vez vivendo”,

repito pra mim,

como quem tenta se lembrar

de que nunca tinha passado por isso antes.

 

Retiro o que disse.

Sim, eu me arrependo de ter mudado de escola.

Eu não precisava passar por isso —

não precisava mesmo.

Podia ter estudado ao lado das minhas amigas,

entre sorrisos calorosos,

entre vozes que me reconheciam.

 

Eu podia ter ido melhor nas provas

se estivesse num lugar em que me sentia confortável.

Mas eu errei.

Acho que errei.

Decidi sair daquele fantástico mundo

que era minha antiga escola,

onde tudo era quente,

onde eu transbordava de boas memórias:

A semana cultural.

As danças.

O itinerário de inspirações artísticas.

Os poemas recitados.

As aulas de beach.

A festa junina.

 

Tudo era colorido,

tudo era feito com carinho.

 

Eu amava aquela escola.

E hoje entendo:

eu também estou vivendo o luto

de um lugar onde eu me sentia vista.

 

Não sei o que passou na minha cabeça

pra eu sair de lá.

Acreditei que, para crescer,

precisava abandonar o conforto.

Mas descobri que não é bem assim.

Quando saí,

me senti pequena e sozinha.

E não cresci como eu queria.

Acho injusto, injusto demais,

poder sofrer o dobro por causa

de notas vermelhas em só uma área em que sou ruim.

 

CN.

Sou péssima, muito mesmo.

Mas sou boa em LC,

sou boa em CH,

sou boa em MT.

E agora, apenas por ser ruim em uma coisa…

posso reprovar.

Posso perder coisas importantes pra mim.

 

E eu nem culparia minha mãe

se ela gritasse,

se viesse com sarcasmo,

com ironia.

Eu culpo a mim.

Por ter sido ignorante,

narcisista,

egocêntrica,

melancólica.

 

E agora?

Parece tarde demais.

Já não há tanto a se fazer.

O grito,

a notificação da recuperação,

a decepção,

tudo virá.

 

Eu me afastei daquela escola.

Não sou mais próxima daquelas pessoas que me faziam rir todo dia.

E também não me aproximei desta nova escola,

Tentei conhecer novas pessoas, mas não eram aquelas.

Eu me afastei de mim mesma.

 

Só Deus sabe como será o ano que vem.

Eu só espero que seja melhor,

seja melhor,

seja melhor.

 

Que o pensamento,

que me corta como uma serra elétrica,

de desistir e nunca terminar essa história

(nunca ao menos começá-la)

saia da minha mente.

 

Porque sempre que ele chega,

o mundo respira em câmera lenta,

e eu só escuto meu coração:

Tum Tum Tum Tum Tum Tum Tum…

até tudo perder sentido.

 

E então vem:

“minha primeira vez…”

Um pensamento talvez vitimista —

é, talvez —

mas é o único que aparece

na hora em que tudo apaga.

Afinal, “é a primeira vez de todo mundo,

quem você pensa que é?”

 

Mas nessa sensação,

eu não vejo mais nada,

não ouço mais nada,

não sinto mais nada.

Só penso em como tudo é injusto.

 

E isso não devia ser motivo de julgamento.

Não mesmo.

Dizer que é drama,

que eu não tenho boletos para pagar,

que eu tenho tudo…

nada adianta.

 

Porque quando essa sensação toma o corpo,

eu não enxergo que tenho tudo,

não escuto nada que você fala.

É minha culpa?

Não.

Não.

Não.

E com certeza não é culpa sua.

 

Acho que estou doente.

E não sei se vou sarar.

 

Porque quando falam de boletos,

eles também não estão sendo ignorantes?

Também não estão pensando só neles mesmos?

Também não estão sem ouvir,

sem enxergar

essa minha dor?

 

É por isso que a depressão pode ser silenciosa,

escondida.

Quando você finalmente abrir os olhos

e tentar escutar,

já é tarde demais.

 

É tarde demais…?

 

Falo disso porque houve um caso recente na minha cidade.

Eu não o conheci,

mas me compadeci da sua morte,

da sua existência em si,

do silêncio do depois —

o depois, o depois…

 

Ele não vale o silêncio

que o fim da sensação promete dar.

Talvez esse seja um dos motivos

que me fazem querer continuar aqui,

sem machucar o corpo.

 

Porque o que me dói,

o que me machuca,

é já carregar todos esses pensamentos,

E escrevê-los assim,

é minha forma de me torturar.

 

Depois, continuo aqui.

Na minha primeira vez vivendo.

  • Autor: Magz!!! (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 14 de novembro de 2025 12:35
  • Categoria: Reflexão
  • Visualizações: 10
  • Usuários favoritos deste poema: Yves de Sá
Comentários +

Comentários2

  • Ana Mota

    Simplesmente impecável! Quanto sentimento, expressão; Senti a intensividade na veia, parabéns!

    • Magz

      Obrigada!!

    • Yves de Sá

      Você escreve como quem sangra com delicadeza, conseguindo transforma caos em poesia e vulnerabilidade em força.
      É raro alguém tão jovem conseguir colocar sentimentos tão complexos com tanta clareza e beleza.

      • Magz

        Muito obrigada!! 🙂



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