Por fim, quebrei os grilhões do hábito vil,
Aqueles que, como insetos na cave do crânio,
roeram as ideias e toldam o juízo.
Mas que vitória é esta que sabe a derrota?
A desintoxicação, um processo atroz!
Não foi uma cura, foi esquartejamento.
Rasgou-me a carne em multifacetados estilhaços,
e em cada um, um relâmpago da minha memória
O desprazer de um segundo, breve e que se tornou eterno em meu corpo,
onde revi o antigo abuso, o hóspede nojento e pálido
que julguei ter expulso com a aguardente do esquecimento.
Me enganei!!! Apenas apaguei a dor até...
Até me perder de mim. E no desvio da alma,
O que me restou? Uma vergonha núbil e visceral.
Parecia estar despida, exposta na praça pública,
E todos ao redor sabiam,
todos viam e me apontavam,
a nojeira, a sujeira que me constitui
de um segredo que grita em silêncio.
(E a culpa? A culpa disso tudo foi tua!
Mas… como, pecadora, se tinhas seis anos?
Até que ponto esta dívida é realmente minha?
Pergunto ao tribunal vazio da consciência,
E só escuto o riso do demônio do absurdo.)
É um inferno esta lucidez! Este carregar
Nas costas um fardo que não contraí.
Prefiro mil vezes o néctar turvo do entorpecente,
A doce podridão da auto-medicação,
A este frio açoite da verdade nua.
Não, não quero a cruz desta inocência culpada!
Devolvam-me o meu ópio, meu embotamento dourado.
É menos doloroso morrer aos poucos
Do que enfrentar a vida com uma chaga alheia.
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Autor:
Anna Gonçalves (Pseudónimo (
Offline)
- Publicado: 24 de agosto de 2025 13:03
- Categoria: Não classificado
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