?? Quando parei de acreditar, comecei a me libertar

Carla Gonçalves

Nota da autora:
Esta é uma carta/poema que escrevi para mim e para todas as pessoas que, como eu, já erraram tentando amar.
É sobre autoperdão, amadurecimento e o encerramento de um ciclo que me marcou profundamente.

Não escrevo para culpar. Não escrevo para buscar resposta.
Escrevo para libertar a dor acumulada, honrar o que aprendi e deixar para trás o que já não me cabe mais carregar.

 

Hoje escrevo para mim.
Não para provar nada a ninguém.
Escrevo como quem cansou de carregar sozinha uma dor antiga
e agora escolhe soltá-la com honestidade, com consciência
e, principalmente, com compaixão por tudo o que viveu e suportou.

 

Durante alguns meses, insisti em algo que já havia se mostrado esgotado.
Insisti porque havia esperança. 
Porque acreditava que, sendo o amor verdadeiro, ele merecia mais tentativas.

 

Mas, no fundo, eu sabia:
Eu deveria ter me afastado.
Eu deveria ter me protegido.
Eu deveria ter escutado a minha dor e respeitado os meus limites.

 

Quis conversar, esclarecer, pedir perdão.
Mas, ao fazer isso tantas vezes, ultrapassei o limite entre cuidado e autocancelamento.
Tentei sustentar uma conexão que já não era recíproca.
Me entreguei a um ciclo que só me devolvia culpa, silêncio, medo e confusão.

 

Eu sabia que ela já não queria me ouvir.
Mas mesmo assim fui até o fim.
Porque precisava que, ao menos uma vez,
a minha dor fosse reconhecida.

 

Precisava que minha voz tivesse espaço,
depois de tanto tempo silenciada por críticas, comparações e expectativas.

 

Mas a verdade é:
Não adianta insistir quando o outro já se fechou por dentro.
E por isso hoje escrevo.
Não por ela.
Mas por mim.

 

Me perdoo por ter engolido frustrações em nome da paz.
Me perdoo por ter aceitado críticas disfarçadas de cuidado.
Me perdoo por ter me moldado para caber em um espaço que já não me acolhia.
Me perdoo por ter calado o que doía em mim e deixado isso sair depois como mágoa ou impulso.

 

Me perdoo por ter acreditado na esperança dos 180 dias
e no fim descobrir que aquele prazo nunca foi sobre mim.
Foi sobre controle disfarçado de cuidado.
Foi sobre como eu precisava mudar para agradar.

 

Me perdoo por ter demorado a entender
que eu não preciso me transformar para caber no afeto de ninguém.
Que a mudança verdadeira só floresce quando é escolhida, não exigida.

 

Me perdoo por ter confundido promessas com esperança
e silêncio com paciência.
Por ter esperado de alguém aquilo que eu mesma precisava me oferecer.

 

Me perdoo por ter permanecido,
mesmo quando tudo em mim gritava para partir.
Por ter acreditado que o tempo mudaria
o que sempre esteve desalinhado.

 

Me perdoo por ter aceitado me reduzir,
para caber em um mundo onde minhas dores eram vistas como exagero,
e minha sensibilidade como fraqueza.

 

Me perdoo por ter sentido culpa por não ser aquilo que ela queria,
quando, na verdade, eu só precisava ser o que eu já era, com verdade e inteireza.

 

Me perdoo por ter feito dos meus erros um castigo eterno,
quando tudo o que eu merecia era acolhimento e recomeço.

 

Me perdoo por não ter reconhecido que, às vezes,
quem impõe prazos para o outro mudar está apenas tentando manter controle,
não construir um futuro.

 

Me perdoo por ter tentado reconstruir sozinha um relacionamento que sempre desabava,
porque não havia base sólida de verdade mútua.

 

Me perdoo, enfim,
por ter esperado responsabilidade emocional de quem ainda não sabia o que era afeto com empatia.

 

Me perdoo por ter usado uma dor real, a doença dela, em um momento de descontrole.
Foi o ponto mais baixo da minha trajetória emocional.
Não me reconheci. E até hoje carrego esse peso.
Mas a verdade é que minha intenção nunca foi ferir. Foi ser ouvida.
Mesmo assim, me perdoo. Porque agora sei que posso aprender e crescer com isso.

 

Eu amei.
Sim, fui amada e amei.
Tivemos momentos bons, únicos, que jamais apagarão da minha memória.
Ela foi importante.
Houve carinho, partilha, presença.
E, em muitos momentos, tentei ser compreensiva com as dores dela,
mesmo sem saber como, mesmo sem ser ouvida nas minhas.
Fiz o que pude com o coração que tinha naquela época.

 

Entendo agora que relações saudáveis são feitas de escuta,
e não apenas de exigência.
Que o carinho não deve ser condicional.
E que não há papel para uma “cuidadora emocional” em um vínculo equilibrado,
só espaço para parceria e troca.

 

Percebo que muitas vezes ocupei o lugar de quem precisava evoluir,
sem que minhas dores fossem acolhidas.
E por isso me calava.
Por isso adoecia.
Por isso explodi.

 

Hoje reconheço tudo isso sem me punir.
Porque não sou um monstro por ter me perdido.
Sou uma mulher sensível, marcada, que agora compreende
que errar tentando amar não me faz menos digna.
E que eu não fui a única a errar.

 

Aprendi que:
Insistir onde não há reciprocidade nos adoece.
Culpar-se por tudo é uma forma cruel de autossabotagem.
E que, quando o amor-próprio floresce, a culpa começa a partir.

 

Agora, sigo meu caminho.
Com o coração mais forte, os olhos mais abertos
e um amor mais inteiro por mim mesma.

 

Obrigada por ter feito parte da minha história.
Você foi um capítulo importante e talvez o mais transformador.

 

Desejo que você também se reconstrua.
Que olhe para si com honestidade,
que se permita sentir,
e que encontre uma felicidade verdadeira.
Não aquela que você se exibe para o mundo,
mas aquela que vive em silêncio dentro da alma.

 

Hoje, escolho soltar.
Escolho seguir.
Escolho cuidar de mim
com a mesma delicadeza que tantas vezes ofereci ao outro.

 

E se um dia você ler esta carta, que saiba:
Não escrevi para convencer. Escrevi para me libertar.

 

Com coragem, verdade e serenidade,
Carla Gonçalves

  • Autor: Carla Gonçalves (Offline Offline)
  • Publicado: 21 de julho de 2025 17:19
  • Categoria: Reflexão
  • Visualizações: 2


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