Meu corpo treme.
[a sessão se inicia]
E no fundo
as pernas afastadas,
o quadril em flor e em fogo.
A cada contração, sou atravessada por uma onda
que não pergunta se estou pronta
ela simplesmente vem.
Sinto o rasgo.
Sinto a terra se abrir entre minhas coxas.
Sinto o tempo parar no instante em que a dor
me divide em antes e depois.
Minhas mãos apertam o lençol
como se ele pudesse conter o universo
que ruge dentro de mim.
Eu grito.
Mas não é um grito de medo
é um chamado.
De mim, por mim.
Há sangue.
Há suor.
Há lágrimas que não sei de onde vieram.
E há algo empurrando de dentro,
não é um filho,
é uma parte esquecida de mim.
Estou parindo o que calei.
Estou trazendo à luz o que me afoguei para esconder.
Estou dilatando memórias,
rasgando culpas,
empurrando para fora a mulher que fui,
para que a que sou possa respirar.
O útero não sabe que não há bebê.
Ele apenas sente o peso da libertação.
E eu... Eu sou todas as mulheres que já sangraram para se tornarem inteiras.
Sou a dor do parto,
sem nascimento físico,
sou o nascimento da minha alma.
E quando tudo termina,
não há choro de recém-nascido.
Só há silêncio....
E, nele, o som do meu próprio coração,
batendo firme, e pulsando meu corpo inteiro
pela primeira vez
em um corpo e mente que finalmente é meu
[novamente]
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Autor:
Anna Gonçalves (Pseudónimo (
Offline)
- Publicado: 24 de junho de 2025 14:47
- Categoria: Reflexão
- Visualizações: 3
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Comentários1
Que força! Seu texto é um verdadeiro renascimento — cru, poético e absolutamente transformador. Você descreve com intensidade o que tantas mulheres sentem, mas não conseguem nomear: o parto de si mesmas. É uma cura que vem da dor, uma libertação que sangra e pulsa. Obrigado por colocar em palavras algo tão íntimo e, ao mesmo tempo, universal.
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