Receita

Libriana

Duas gemas, quatro xícaras de trigo, três colheres de margarina, 400 ml de leite e um fermento seco.

Faz um tempo que venho reprimindo tudo o que eu deveria falar. E então, uma inquietação, um balançar de pernas, um apertar de mãos e, quase sempre, aquela sensação de engasgo, de palpitação, de simplesmente sentir que há algo de errado.

Onde olhar revela sinceridade, o meu prefiro manter desviado. Notar o que de fato sinto só me faz sentir mais odiado.

E a irritação, o quebrar das coisas e, depois, se sentir culpado... o trovejar de palavras duras e perceber que você é o único malvado.

Quando você chora, não por dor, mas por estar cansado, o sentimento de se sentir encurralado só me traz à mente que não tenho ninguém ao meu lado.

O olhar vazio de quem já não vê nada, que não busca, que está machucada.
Você perde a sensação de pisar no chão porque o tempo todo sente que está deitada, porque o tempo todo sente que é apenas corpo carregado por nada.

O ódio por si mesma, a decepção, a fúria... a morta que fala, que se arruma, que de viva se faz.
Não passa de comédia o "faz-me rir", o encaminhar de uma tragédia.

Eu esqueci as três colheres de açúcar — e, no fim, a massa ficou sem gosto.
Não foi esse o motivo que fez a lágrima cair.

Mas sim sentir a semelhança...
A expectativa de que o fim seria ótimo — e perceber que não alcançou o mínimo do esperado.
Na verdade, a massa foi espelho do que eu sou.
Uma farsa.
Um ser triste, em que a felicidade parece algo que esse ser nunca alcançou , mas no fim algo que nunca a lutou. 

  • Autor: Libriana (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 14 de junho de 2025 19:29
  • Categoria: Não classificado
  • Visualizações: 4


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