Fantasma pt.5

Isis P. Toldi

Então… ele partiu.
O espectro.
Desfez-se como neblina sob um sol apático,
mas deixou na poeira um gosto de ferro,
a cicatriz do que não se apaga.

Depois de dias que se estendiam
como preces esquecidas no escuro,
sumiu.
Não com estardalhaço,
mas com a quietude das coisas que nunca gritam.

Mas não levou tudo.
Ficaram os ecos,
marcas negras nas frestas da alma,
lembranças que mordem os calcanhares da consciência.

Ele quis lutar.
Mas como guerrear
quando o inimigo mora no espelho?
Quando a lâmina é o próprio pensamento?

Tentou sair da casa,
como se o mundo de fora o salvasse.
Levava apenas as roupas do corpo,
um bolso furado com dois caramelos ocres
e uma tesoura,
furtada de um lugar que a memória preferiu apagar.

Mas não cortou a linha.
Não findou a travessia.
A tesoura caiu,
tão esquecida quanto ele.
Os dedos tremiam, não de medo,
mas de um frio antigo, sem nome.

Sentou-se na calçada,
a rua quieta como um velório sem velas.
E ali, entre um suspiro e o nada,
tirou do bolso o que lhe restava:
um frasco de vidro,
translúcido como lágrimas secas.

Engoliu o mundo em goles curtos.
Bebeu como quem se afoga com prazer.
Não pela morte,
mas pelo esquecimento.

E então,
adormeceu.

  • Autor: Toldi (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 28 de maio de 2025 10:45
  • Categoria: Triste
  • Visualizações: 3


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