Havia um punhado de cartas na gaveta,
amareladas, caladas, cheias de pó —
nunca abri, nunca tive coragem.
O tempo enrolou os selos,
o cheiro era de coisa que sangra devagar.
Eram tuas palavras, eu sei.
Tuas mãos, tua letra torta,
teus silêncios desenhados entre linhas.
Mas faltou-me fôlego.
Faltou-me peito para tanta verdade.
Fiquei aqui fora,
enquanto os papéis esperavam
como esperam os cães que já entenderam
que o dono não volta.
Eu quis te esquecer
antes que o papel gritasse.
Antes que tua voz pulasse das frases
e me dissesse que doeu,
ou pior — que não doeu nada.
Às vezes sonho com essas cartas abertas,
mas nunca consigo ler.
As palavras viram água,
as linhas se embaralham,
e tua ausência me acorda.
Já pensei em queimá-las.
Mas seria como matar uma parte tua
que ainda mora aqui,
num canto que nem eu alcanço.
Então elas ficam.
Empilhadas, esperando
que um dia eu seja menos covarde,
ou mais inteiro.
Talvez no último dia,
quando o mundo calar,
eu as leia todas,
e chore tudo que guardei
por medo de te entender demais.
27 maio 2025 (10:42)
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Autor:
Melancolia... (
Offline)
- Publicado: 27 de maio de 2025 09:42
- Comentário do autor sobre o poema: Ruim demais quando revemos as mesmas cartas antigas.
- Categoria: Triste
- Visualizações: 11
- Usuários favoritos deste poema: Melancolia..., bebelly, MAYK52
Comentários1
Acontece muitas vezes estas situações. Não damos relevância na altura a estas missivas, depois mais tarde vamos rele-las, e surpreende-nos o que lá dizem...
Gostei deste triste, mas belo poema.
Abraço, amigo Melancolia!
Grato pelo relevante comentário....
Abraços e satisfação pela visita...
Falou tudo.
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