Mãos sujas

Isis P. Told

Escravos a sós
embarcaram sem escolha,
sem nome, sem terra,
sem amanhã.

Fiquem. Morram.
Quem se importa?
Foram moeda, mercadoria,
ossos que pavimentam ruas
onde seus filhos ainda correm
fugindo de balas perdidas.

"Deixe-me ficar!"
Mas ficar é um luxo,
é ter teto, terra, futuro.
Ficar é um direito
negado por séculos,
roubado com grilhões,
mantido com muros invisíveis.

Queremos? Não queremos?
O que importa querer,
se a escolha é sempre deles?
Os donos dos navios,
dos bancos, das leis,
dos portões altos
e das mãos limpas.

Façam zig, zig-zag,
dancem como querem,
morram como planejam,
sumam nas estatísticas
que ninguém vai ler.

E o mar, cúmplice e mudo,
engoliu corpos, apagou nomes,
mas o sangue ainda mancha a areia,
e o vento ainda sopra a verdade:
o passado nunca foi embora.

  • Autor: Told (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 30 de abril de 2025 00:12
  • Comentário do autor sobre o poema: As mãos limpas são as únicas permitidas a escreverem seus caminhos na história.
  • Categoria: Sociopolítico
  • Visualizações: 14


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