PRAZERES COMPRADOS

Charles Araújo

PRAZERES COMPRADOS

 

— Bem feito! — dizia ela, mas só com o olhar.  

Ele apenas vestiu a camisa, calçou os tênis, lançou um aceno sem qualquer peso e saiu porta afora.  

— Volte aqui, seu cafajeste! — gritou, mas sua voz se perdeu no eco do apartamento vazio.  

Rasgou os lençóis num acesso de raiva, levantou-se nua, foi até a sacada e acendeu um cigarro com as mãos ainda tremendo. Lá embaixo, viu quando o sedã preto saiu da garagem cantando pneus, desaparecendo na noite.  

Quisera ela mais algum tempo, mas no fundo sabia que só possuía aquilo que o dinheiro podia pagar. E nem sempre o mesmo tinha todo horário.  

A raiva mal havia passado quando o telefone tocou.  

— Meu bem, desculpe… O dia hoje foi corrido — sussurrou uma voz sedutora do outro lado da linha. — Mas de todos os lençóis, os seus são os mais macios e sedosos. E olhe que, com você, eu nunca reclamei do cheiro da nicotina.  

Ela bufou, lançou um olhar perdido para a cidade e espraguejou tudo o que fosse santo ou demônio. Tragou fundo, apagou o cigarro na beirada da sacada e serviu uma dose de uísque sem gelo. De gelado, já bastava a indiferença do seu jovem rebelde.  

A noite caiu densa sobre seus ombros quando o telefone voltou a tocar. Dessa vez, a voz do outro lado não era envolvente nem sedutora.  

— Conhece fulano de tal?  

Ela hesitou.  

— Sim… Conheço.  

— Antes de entrar em coma, disse que você era a única coisa que ele tinha no mundo. O quadro é grave… múltiplas fraturas, hemorragia torácica...  

A garrafa tremeu em suas mãos antes de encontrar sua boca. Engoliu o uísque sem respirar, largou tudo e correu porta afora.  

Embriagada pelo álcool e pela notícia, tropeçou nos próprios pés e despencou escada abaixo.  

Os vizinhos acordaram com o estrondo e, nos segundos seguintes, ouviram os últimos suspiros de uma mulher que, apesar do dinheiro, nunca soube o preço do amor verdadeiro.  

Porque sim… Ele era um cafajeste, um pilantra. Mas não havia outro que soubesse tratar uma dama como ela merecia — ou, pelo menos, como seu dinheiro podia pagar.

 

  • Autor: C.araujo (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 1 de março de 2025 14:17
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 3


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