Leiria, 5 de julho de 2024

Thiago Santos

Minha querida Esther,

 

Hoje te escrevo movido por uma necessidade humana e irrefreável de chorar. Quando choro, é porque meu mundo está tempestuoso, desmoronando. Só derramo lágrimas quando não consigo mais suportar a dor que reside dentro de mim. Sou um homem, e choro apenas quando ninguém está a me observar. Deve ser assim. Sempre foi assim.

 

Estou hoje vencido, como se tivesse perdido todas as batalhas. Estou hoje perplexo, como alguém que pensou, chorou e esqueceu. Estou hoje lúcido, como se estivesse prestes a morrer. De repente, a vida se revelou real para mim. Senti isso no exato momento em que estava pensando nas universidades em que poderia entrar — eu me vi dando o fim ao dilema de faculdade ou sonho. É absurdo, mas quando menos percebi, envelheci. A infância mal aproveitada ficou para trás, passou tão rápido que só pude guardar mágoas. Encontro-me em uma guerra tola contra o maldito tempo; ele é inevitável, vai me esmagar, vai me vencer.

 

Quando eu era mais jovem, sempre diziam que eu iria chegar longe. Olha só o fundo do poço onde estou. Talvez, ao dizerem "longe", quisessem dizer que não me queriam por perto. Agora, todos que me veem e falam comigo estão conhecendo-me por tudo que não sou e nem represento. Estou me perdendo nos personagens. A vida está sendo tão covarde. Eu não quero ser mais um.

 

Thiago, quem é você? Já não sou mais criança; agora, minhas escolhas pesam mais na balança. Meus pais não têm a mesma saúde. Tive tanta coragem, só não tive atitude. A vida adulta me engana; divido minha cama sempre com alguém que não me ama. Essas águas passadas deixam mais difícil manter acesa minha chama. Minha luz há tempos foi apagada depois que me cortei em pedaços para me enxergar inteiro. Sinto que não tenho mais nada.

 

Sempre me subestimam; depois que me conhecem, passam a me superestimar. Fui incorrespondido a vida inteira. Não tenho motivos nem formas para pensar que isso pode ser de outra maneira. Sou um abjeto, restam-me apenas as sobras de amor. Só me restam as migalhas de compaixão no mundo. Tento me convencer de que tudo bem chorar, pois, se eu não me convencer, quem o fará? Admito que esperava muito mais de mim mesmo.

 

Sei que a vida não acabou; ainda há muito pela frente. Temo isso como qualquer um teme o desconhecido. Mesmo assim, eu tenho a forte certeza de que me mato cedo, mas eu ainda sonho. Eu odeio me. Tenho que escrever o mesmo tanto quanto penso. É um fardo, eu me arrependo. Eu preciso viver. Há muito parei de respirar. Meu coração só precisa de ar.

 

Articular meus planos no papel soa muito bem. O tempo me cobra desde quando era garoto.     Tic tac. Eu não costumo usar relógio; tenho medo do tempo, mas no fundo só quero que alguém pegue na minha mão e me diga que nada disso deve ser levado a sério. Já tomei três copos de cafeína e ainda me sinto num cemitério. Essa loucura não vale minha sanidade. Todos os resquícios da minha alma são fragmentos de saudade.

 

Saudades de mim. Faz tempo que não vejo o Thiago. Estou definitivamente ficando louco. A loucura não está trazendo a calma com a aceitação de que as coisas são porque são. Meus dizeres me escorrem; sinto muito medo do meu cérebro. Da minha janela, vejo mais um sol nascendo e as outras estrelas morrendo. Mais uma noite sem dormir. Seis e trinta e um da manhã.

 

Eu me sinto com o peito em chamas, meus sonhos não cabem em meu sono; eu acordo mil vezes. Quem vai salvar meu mundo? Tenho que tentar não lembrar que o tempo voa, o destino há de cair como a chuva e lavar tudo. Estou gasto assim como minhas blusas velhas, meu pensamento me matou, inclusive ainda vivo. Eu só quero rimar, não quero sentir o peso desse mundo. Há muitos motivos para eu ter meus dias escuros. O que me torna gente está esquecendo de ser humano. Quando o tempo passou, eu perdi minha criança.

 

Quem me dera ter nascido livre, viver como canção para um dia morrer como hino.

 

O que será que a vida reserva para mim? Serei um poeta importante? Ou um mero vendedor de amendoim?

 

Com toda a minha angústia e com milhares de abraços quentes do meu coração frio,

 

Thiago Santos

  • Autor: Thiago Santos (Offline Offline)
  • Publicado: 10 de julho de 2024 09:47
  • Comentário do autor sobre o poema: Uma carta para minha melhor amiga sobre meu estado mental
  • Categoria: Carta
  • Visualizações: 9
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