Roberto Ornelas

A Vida Pregando Peças  

A Vida Pregando Peças  

Em umas das minhas caminhadas sem compromissos, faço isso de vez em quando, pra relaxar, espantar o estresse, me encontrar. Em uma destas, passava por um local e ouvi uma canção antiga, linda, vinda de um restaurante em frente a uma praça.

Resolvi sentar num banco próximo e beber uma cerveja, um cão solitário me olhou, sentando-se ao meu lado, me fazendo companhia em minha audição nostálgica e solitária. Minha mente fez uma busca automática pelo tempo, num passado um pouco distante, quase esquecido e intacto, ela aparece em minhas lembranças e sem pedir licença acomodando-se calada, dava pra vê o seu sorriso, seu rosto, seus lábios carnudos, como és mais linda ainda na minha imaginação.

Se passara quase uma hora, achei melhor seguir o meu caminho, o futuro é logo ali e me aguardava, deixei os meus pensamentos saudosistas e vagos na praça, olhei para o cão sonolento, este levantou a cabeça e abrindo os olhos intrigados, levantou se espreguiçando todo, parecia me entender, balançou o rabo como uma despedida e seguiu seu caminho cheirando um poste, tudo ficaria bem com ele também, pensei.

Estava me sentindo mais leve, meio confuso e sonolento, igual ao meu amigo vira-lata, mais estava bem, ficaria bem, caminhava distraidamente, assobiava o refrão da última canção antiga ouvida na praça, meus pensamentos fluíam, eu estava viajando novamente, parecia flutuar, talvez fosse o efeito das cervejas e me peguei vagando pelo passado nos meus labirintos mentais.

Tive a sensação estranha que ela estava ao meu lado, me acompanhando entre ruas e ladeiras, imaginei sua sombra, lembrava de trecho de nossas conversas quase sussurradas em nossos ouvidos, de nossos risos ingênuos e despretensiosos, dos nossos olhares cúmplices que se entendiam sem palavras... Olhares agora perdidos no tempo, senti até o seu cheiro purificando meu ar…respirei fundo para senti-lo mais forte, parece até que senti, hum!

Ah! Doce delírio.

Ás vezes o passado estar logo ali, às lembranças são tão forte, estacionadas em nossa mente, perto da rua das lembranças com a esquina das saudades eternas, ao nosso alcance, tentando se misturar ao nosso presente, mais sem êxito, pois o passado não poderá ser mais editado…Mesmo que imperfeito seja, está feito, escrito, sacramentado.

Continuei andando…Estava difícil tirar ela da minha cabeça, começou a chover um pouco, molhando os meus pensamentos pouco a pouco, agora já poluídos e um tanto obscenos… Dei graças a Deus pela chuva.

Corri para um abrigo, me protegendo da chuva agora forte, torrencial, um dilúvio, afogando minhas saudades, desbotando todas as minhas lembranças, colorindo as águas aos meus pés.

Mas ela continuava na chuva, intacta, linda, mesmo em preto e branco.

Roberto Ornelas

  • Autor: Roberto Ornelas (Pseudónimo (Offline Offline)
  • Publicado: 27 de Outubro de 2022 07:32
  • Comentário do autor sobre o poema: Uma viagem em meus pensamentos.
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 5


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