Guloso

sofrimento e fim

Era noite e estava garoando forte, o suficiente para molhar-me, ao chão e encharcar os sapatos; os reflexos das luzes dos postes tomavam conta das calçadas molhadas; para completar a cena tristonha estava frio, caminhando rápido com as mãos nos bolsos do casaco e com o pensamento fixo nela, que me trocou por outro, pôs fim à angústia; eu não via a hora de chegar em casa, respirar sem "baforejar", tirar os sapatos e meias molhados, acalmar o coração que estava "a mil" e me sentar no sofá, aonde, por várias vezes, eu e ela nos sentamos e nos aconchegamos nas almofadas. Eu, apesar de tudo, ainda estava profundamente enamorado dela e a voraz solidão ameaçava alimentar-se da minh’alma fragilizada e vulnerável. Depois do basta dela, eu resolvi ir a pé na garoa mesmo, para que a água que caía do céu em meu rosto disfarçasse as minhas lágrimas e, entrando pela minha boca, refrescasse um pouco o calor provocado pelas chamas que dominavam o meu coração. Um sorriso enorme enfeitava o rosto lindo dela enquanto ela me dizia para não a procurar mais e esta imagem ficou indelevelmente tatuada em mim, na minha pele e no meu coração; não chorei naquele momento, mas derreti-me copiosamente no caminho para casa, que eu nunca mais percorreria. Eu queria morrer naquela noite, já com saudade dela e profundamente magoado; imaginá-la feliz nos braços de outro, doía bastante, mas eu sobrevivi à tormenta e à noite medonha. No dia seguinte, levantei-me, lavei as marcas das lágrimas que entristeciam ainda mais o meu rosto, mais conformado com a súbita desilusão e perda, apesar dos sinais que há algum tempo demonstravam que algo estava para acontecer, os repentinos momentos de profundo silêncio dela e os seus frequentes suspiros de impaciência, prenunciavam o enfastio que eu lhe provocava; vendo, agora, a correlação destes sinais com a tempestade que se abateu sobre mim, eu fiquei grandemente decepcionado comigo mesmo e fiquei indagando-me: o que foi que eu fiz para merecer isto? Nada, apenas amei quem não me amava. Os dias se passaram, o inexorável tempo acompanhou-os, o meu coração e a minh’alma cicatrizaram-se e eu estou aqui, cheio de saudade e de mágoa.

  • Autor: Guloso (Offline Offline)
  • Publicado: 22 de Janeiro de 2022 20:35
  • Categoria: Conto
  • Visualizações: 5

Comentários1

  • Maria dorta

    A vida é mesmo assim,poeta: cheia de contradições,de amores e desamores,chegadas e partidas. A vida nos faz também aprender a lidar com essas desilusões e faz_ nos mais fortes. Nem tudo é como queremos mas tudo nos ensina a ser mais fortes,fazer melhores escolhas e seguir acreditando no Amor! Chapéu,!



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