NO
PEDRAS E DESEJOS
Dia sim,
outro não, a gente se vê lançado
em alguma situação que nos coloca em uma condição
que jamais esperávamos estar: eu estive e não consegui evitar:
estava triste andando por um caminho sozinho de pés descalços e travado de sentimentos: alheio a todo o resto que me rodeava, quando, pego de surpresa, me deparei com nove pedras de tamanhos e tipos diversos.
[Outros restos de desentendimentos: "sentimentalismo bobo?" Acho que não!]
Seguindo o meu caminho solitário, e agora com nove pedras em minhas mãos, comecei a falar sozinho em alta voz e focar em outra situação: quando de repente lanço fora uma delas e nomeio-a com um desejo, passando, pois, dali por diante, a ser o primeiro dos meus nove representados cada um em uma pedra daquelas nove que encontrei. Nesta primeira pedra lancei minhas decepções, desejando de volta uma experiência pura de amor sincero: e continuei caminhando...
Até chegar na segunda, que me permiti vacilar em nome de algo que jamais poderia deixar passar, e joguei com gosto a pedra ao longe desejando que nela fosse todo o sofrer familiar: esta poderia ter sido a primeira, mas preferi assim mesmo deixar...
Veio a terceira e nesta eu toscanejei e deixei-a escapar (sem querer, de verdade), caindo bem próxima ao meu pé direito resolvi ali mesmo deixá-la desejando que com ela permanecesse a cicatriz da minha perna esquerda e, com isso, as minhas raízes viria (de novo) reencontrar...
Eita! Na quarta começou a chover e eu a correr acabei por escorregar, então, na lama uma caiu e eu bem perto de um rio comecei a me lembrar da infância que um dia vivi e esta pedra (na lama) resolvi deixar: esta quarta me custou bem cara porque muitos traumas me lembrou, e me acabou se tornando rara, me jogando tantas coisas na cara. Contudo, eu, insistentemente, resolvi seguir, e, me arrastando entre lamas e matos secos e escorregadios, consegui chegar num beco logo depois daquele rio: escuro, mórbido e, necromanticamente, atraente à alma mais atormentada que venha a existir neste mundo de desilusões constantes, assim, resolvi deixar cair, meio que "sem querer", a dita quinta pedra da minha mão trêmula, bem ali para que todas as coisas que me tentaram puxar para a escuridão parassem naquele exato ponto me deixando seguir em paz neste torrão. E aqui é revelado o meu quinto desejo: paz na vida e muito sossego... que mesmo com medos eu consiga resistir: seguindo em minha caminhada até o porvir... tornando-se, então, o mais desafiador, e ponha "dor" nisso tudo.
Fiquei um tempo "surdo" e sem poder ouvir acabei ficando "mudo" seguindo o meu caminho devagar: a me arrastar; arranhar; arriscar demais ao ponto de, lacrimejando os olhos e "poeiras" a evitar, gritar o mais alto possível para poder conseguir ser visto em meio a uma multidão de sentimentos avassaladores que me tomavam naquele momento tenso... conturbado... “— que aperreio de vida danado...”
Sucumbindo por dentro: foi assim, devagar, que acabei chegando na sexta pedra, depois de uma batalha intensa e, internamente, violenta contra o que... "nem quero lembrar mais", entidade voraz! Que me assustou e me fez parar, pois, vi tanta gente que já se fora, que até pensei ter ido também para um plano não terreno que agora acho que não me convém, assim, um novo (antigo) desejo saiu meio que "sem intenção" da minha boca, até de uma forma meio tosca, mas não me neguei de assim o fazer: entender o "além mar": representativo no mais amplo estado da pós existência deste plano "real", que, de tão desafiador, acabou se tornando banal e meramente passageiro em seu subverso estado de existência plena, que pena... na alma: devaneios!
Vida e morte sem desesperos e choramingos por serem, inevitavelmente, complementares uma da outra... outra(o): palavra de neutralidade e indefinição, mas que representa algo tão importante para uma boa convivência, uma busca por união, como a lembrança de um outro irmão. E foi nesta discussão que resolvi, por conta própria, deixar a sétima pedra bem do lado desta sexta e de cara externei o tal desejo que nela ficaria registrado: seguir vivendo a empatia e do mal viver sempre afastado... atrasando o próprio caminho para deixar males maiores passarem sem que me firam, sequer me vejam...
Quando me dei conta estava apenas com duas pedras em minha mão e do caminho já nem me lembrava mais: tudo ficou muito claro, havia luz demais, e para trás nem conseguia olhar. Os tais ‘males’ realmente passaram e me deixaram seguir em meu caminho, então, segui em frente sem nenhuma pedra deixar, mas, só até certo ponto, pois, mais à frente me vi de frente a uma coisa que me fez repensar: chegou a hora da oitava pedra deixar. Contudo, não a soltei de qualquer jeito, pois, precisava de carinho, precisava de apreço e de tranquilidade para um possível recomeço... (— a famigerada “volta por cima”: de que é melhor nem comentar...) e ali a dita pedra iria ficar... antes disso: descansei da caminhada porque fora muito cansativa e, depois de um cochilo, quase que vacilei com a última pedra, porém, a segurei a tempo não a deixando cair: ela representava uma criança que para mim se pôs a sorrir, logo, muito envolvido, me vi permitido a ter a obrigação de cuidar dela com o máximo de atenção, muito afago e respeito à vida — puro coração — pura intenção: uma imensidão de sentimentos puros! Depois de um tempo:
assim, bem devagar, fui descendo a mão de encontro à terra:
cavei um buraco com cuidado;
forrei um lugar agradável deixando-a confortável;
e ali a oitava pedra coloquei representando a esperança;
afagando-a com a terra morna, e deixando-a respirar bem, fiquei ali de vigia desejando-a paz e muita proteção para a vida...
Depois disso, e ainda ali sentado de vigia, a nona pedra guardei porque foi nela que resolvi depositar todas as minhas lembranças, e, como um back-up, decidi deixar tudo guardado: amparo em meio a desesperos e desilusões. Uma restauração de ânimo sobre tudo que vivenciei:
decepções: desejando de volta uma experiência pura de amor sincero;
sofrer familiar: porque me fez ser quem hoje eu me tornei;
a cicatriz: por ser parte de uma fase da vida que me fora inevitável, porém, útil ao crescimento pessoal;
traumas, como resultados do NADA e do TUDO que vivenciei em minha trajetória, às vezes simples outras, não, contudo, inglória;
paz na vida e muito sossego: sendo, pois, um puro desejo de viver da melhor maneira possível;
entender o "além mar": porque, de verdade, tudo aqui é transitório, ainda que com um repertório digno de respeito no caminhar;
seguir vivendo a empatia e do mal viver sempre afastado: por ser a melhor forma de se ter “uma vida plenamente feliz e dos males sempre afastado”;
esperança: porque ela é o combustível capaz de nos manter de pé;
Nona pedra carregada de emoções, apegos e sonhos: porque nas lembranças de tudo que vivi posso dizer, com certeza, que hoje sou uma pessoa feliz. Mesmo que ninguém consiga ver esta tal "felicidade", mas, é que ninguém precisa vê-la mesmo... ela é minha e eu a quero vivenciar, sorrir, correr, gritar(...), apenas, ainda que a venha compartilhar depois, não preciso que saibam que a consegui: vivê-la intensamente já me satisfaz, e entendê-la já sou capaz, então, não preciso de afirmações alheias a algo que conquistei. Amei... amo... amarei... distante de tudo e de todos que apenas desprezos observei ao se dirigirem a mim: sobre tudo isto sou SOLITUDE!
[As felicidades são minhas e os seus preços já paguei (ainda os pago, e os pagarei)!]
Eis que vejo uma luz fulgurante surgindo lá no horizonte me transmitindo a PAZ tão desejada: reluz, óh, VIDA minha! Aquieta-te ante à vitória muito esperada por ti mesma, que, de tão bela, tornou-se virtuosa em sua plena existência e, vigorosamente, à esperança guardada em back-up, que em tempo hábil virá outra vez habitar o teu coração.
- Autor: CASAVERDE (Pseudónimo ( Offline)
- Publicado: 3 de abril de 2021 17:31
- Comentário do autor sobre o poema: Uma simples caminhada; Um abaixar rápido colocando a mão no chão; Trazendo algumas pedras; Nasceu este poema, então...
- Categoria: Não classificado
- Visualizações: 10
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