Cecilia

ONTEM

ONTEM                                                                               

 

                                                     

 

Chegou antes dos outros  ao escritório, maldizendo a chuva, igualzinha  à de ontem.

Parabéns, José.  Folgue no seu dia.   Até amanhã.

O aniversário fora ontem, mas era doido de corrigir o chefe?

Foi ler jornal na Biblioteca. 

 Impressão estranha de  já haver  comentado as notícias.   Pudera, o jornal era de ontem, quarta.

  Que coisa, não haverem atualizado o  jornal!

  Escolheu um livro de mistério, recém- chegado.  

  Gostava do  argumento, sobre mortos recentes, que não se davam conta da passagem para outro mundo.   Sentiam-se vivos, e se aferravam ao seu espaço na terra, às suas rotinas de sempre.  Até que alguém os convencesse de seu óbito.

  Leu depressa, parecia conhecer o enredo, o desfecho não foi surpresa, que chato!

  No restaurante habitual quis o prato do dia, quinta-feira, rabada com polenta.  Hoje temos feijoada, rabada só amanhã.

 Tinha comido feijoada ontem...

 Pensou aproveitar a folga,  visitando a mãe.   De novo?  Estivera com ela ontem, comemorando o aniversário.

 O jeito era ir embora, dormir.

 Ops!   Bueiro aberto.   Quase!

 Já perto de casa avistou, na rua transversal, um cortejo pequeno, simples.   Reconheceu dois primos, carregando o esquife.

  Quem teria falecido?    Se amigo, ou parente, tomaria uma ducha rápida e chegaria ao cemitério ainda a tempo.   Apressou o passo.

Encontrou a porta aberta, senhoras com o logotipo da funerária, atarefadas em varrer, limpar, transportar cadeiras..   O que teria acontecido?

Coitado do moço!  Caiu no bueiro  ontem, no dia do aniversário.

Ontem...