Henrique Amaral

Todos Sós

Todos Sós (*)

 

Um dia você ouve: “estou do seu lado”

E, ao sair, essa boca diz “se cuide”.

Ou seja: “cuide-se você mesmo.”

O mundo é assim.

E não há como ser diferente.

 

Naquela hora difícil você escuta:

“me preocupo com você”.

E a mesma voz parte dizendo: “fique bem”.

Ou melhor: “fique aí, que eu já vou indo”.

Você, eu, todos somos, afinal, assim.

E não há modo.

Todos nós, todos sós.

 

E diante das dificuldades, ela fala:

“Estou do seu lado”.

Contudo: é até a segunda página,

é apenas o que estiver sobrando,

de esteio, admiração e carinho.

Desde que o mundo é mundo.

E não há meio.

Todos nós, todos sós.

 

E perto do fim, ela lhe diz;

“Não faça isso, queira viver!”.

“Estou aqui para ajudar”.

Porém: nunca são as duas moedas da viúva,

é apenas o excesso,

de alimento, afeição e amor.

As coisas são como são

E não há jeito.

Todos nós, todos sós.

 

E você pensa: “chega, estou cansado”.

E ela grita: “não se mate agora”

Ora: “você pode se matar lentamente,

desde que tome seu remédio”,

e fique bem para mim.”

Para mim? O que isso significa?

Significa que é assim o mundo,

que, afinal, todos somos assim,

que, desde que o mundo é mundo,

as coisas são como são.

E não há maneira.

Todos nós, todos sós.

 

       (*) Henrique Amaral