Cecilia

ÚLTIMO BEIJO

ÚLTIMO BEIJO

 

Casaram-se e foram felizes para sempre.

Fomos.   Na vida real, um dia o sempre se bifurca,

o amor persiste, em planos paralelos.

 

Dias e dias, dias e dias, na hora marcada,

eu o visitava na UTI, inerte, lasso,

perdido no coma profundo.

 

Ansiava por um gesto, um suspiro,

um sinal de vida, além dos números,

 e linhas dos monitores ligados.

 

Esperava que abrisse os olhos.  

Ainda me conheceria, talvez?

Não pude ver a luz do seu olhar.

 

 Que me chamasse.   Saberia meu nome?

Perceberia minha presença fiel?

Não ouvi o sussurro da sua voz.

 

No último dia, num repente,  apertou 

com força a minha mão.   Busquei seus olhos,

as pálpebras não se abriram.

 

Nem um traço mudou, no rosto calmo,

mas os lábios arredondavam com firmeza

nítida e improvável boca de beijo.

 

Poucos segundos, eternos na memória.

Das sombras do limbo, no derradeiro esfôrço,

meu bem me atirou seu último beijo.