o mar exibia um verde campestre,
o sargento, mestre, eu, cabo,
contramestre, fomos ao mar na sexta-feira
apanhar passageiros com o aviso Oiapoque U43.
mal saíamos do cais e avistamos uma barca
que passava muito longe a atracar na Praça XV.
a barca que nos viu por boreste
não passou por nossa popa.
naquele instante minha mente projetou um Z na água,
podíamos colidir no final da diagonal daquela letra
e a risada foi geral, dá café para acordar, olha a distância,
olha o tempo, disse o sargento.
a barca indo em direção do aeroporto
e a gente ainda no 1º Distrito Naval.
eu já escrevia poesia e não era o cabo falando,
era o poeta vendo o que os outros não viam,
aquele Z sobre a água que tanto eles combatiam,
ele está emocionado, acabou de ser promovido!
dá café a ele!
sob risadas repetidas coloquei o salva-vidas,
de repente um nevoeiro escondeu toda a cidade,
pedi que tocasse o sino, pedi que apitasse a sereia,
mas o sargento viu em mim um caso de enfermaria,
vamos dar uma injeção, vai parar de ter visão!
e mais de duzentos homens me entregaram à solidão.
o poeta é solitário...
de bombordo para boreste passou uma rajada de vento
e vi a cara da barca que deixaria marca no presunçoso sargento.
a barca colidiu, rasgou a bochecha de boreste,
o sargento arremessado, ensanguentado,
o timão abandonado, ficamos adernados,
por pouco não emborcamos, naufragamos.
e todos chamando por Deus.
a barca trepada no navio, engatada, baleia enfrentando tubarão.
o mestre da barca Itapetinga mexeu na manete, deu ré,
fumava tranquilamente cachimbo, e como um animal vencido
arrastou-nos para o cais.
o sargento disse ao comandante que eu atraía acidente,
o comandante riu, cem vezes vai ao mar volta em jejum,
refutou, ele é poeta, lê as nebulosidades...
não se vai ao mar na sexta-feira.
os números proíbem.
grande a fome do abismo.