Versos Discretos

A Visita Inevitável

Ela caminha com a languidez de quem conhece cada centímetro deste assoalho. Despojada de adornos, sua nudez é um mármore frio que reflete o vazio das paredes. Não há seda que a cubra, apenas a penumbra que se molda às suas curvas inexistentes e, ainda assim, tão presentes.

Sinto seu hálito gélido em minha nuca, um sussurro que não articula palavras, mas que preenche o silêncio com um peso insuportável. Quando tento desviar o olhar, encontro-a no reflexo de cada espelho, em cada sombra projetada pelo cansaço. Seus braços, longos e pálidos, enlaçam meu pescoço não com a fúria do desejo, mas com a persistência do abandono.

É um erotismo desolado. O contato de sua pele com a minha não gera calor; é o encontro de dois desertos sob o frio estelar. Ela se deita ao meu lado, e sua presença é uma geografia de ausências. Procuro o pulsar de um coração em seu peito, mas encontro apenas o eco rítmico da minha própria desolação.

Não há como fugir dessa alcova. Quanto mais tento me desvencilhar de seus dedos longos, mais eles se enredam em minha alma. Ela me possui com a autoridade de quem não pede licença, consumindo meus dias com uma volúpia melancólica, transformando o prazer em um rastro de cinzas na boca.