A sola do sapato gasta
De tanto vagar pelo mundo
Permite sentir o calor do chão
De concreto
A dor causada por cada pedra
Que o pé pisa,
Na ida, na vinda,
No fluxo contínuo dos dias.
A cabeça cansada
Da falsa simpatia
Na cidade da ilusão,
O peito grita silenciosamente,
Não se pode demonstrar
O que traz por dentro.
Estamos todos adoecendo
Dia após dia
No corpo,
Na mente,
Nas marcas eternas
Que trazemos na alma.
Reflexo dessa realidade doentia
Que criamos à nossa volta.
A amendoeira no ponto de ônibus
Traz em sua sombra um leve alívio,
A brisa de maio acaricia o corpo.
Fazem-nos esquecer
por um momento
Que a vida é o breve ensaio
Da morte.
Tudo morre, as flores, as crianças
Os belos dias com suas luzes,
E no entanto continuamos vivos
Persistindo com a bravura infante
De um espírito perdido
Em meio ao caos.
Resistindo ao fim que nos é guardado.
A castanha de caju na calçada suja
Lembra a primeira tatuagem
Marcas duradouras dum passado puro.
Faz lembrar que tantas outras marcas ainda virão.