Wander Motta

Carta de desabafo ao Overmundo



Querido Overmundo

Escrevo esta carta como quem fala alto depois de muito tempo em silêncio. Não para cobrar respostas, mas para aliviar o peso de uma ausência que ainda dói.

Houve um tempo em que escrever não era falar sozinho. No começo dos anos 2000, quando a internet ainda permitia demora, cheguei até você por indicação de um primo. Professor, escritor, alguém que reconheceu nos meus textos de blog um desejo de mundo. Ele disse, de maneira simples: “seus textos têm a cara do Overmundo”. Eu acreditei.

E fiz bem em acreditar. Porque você não era apenas um lugar para expor textos. Era uma ponte. Entre o que eu escrevia por impulso e o que ganhava forma quando alguém lia, comentava, votava. Nada era automático. Nada era frio. Para um texto existir, precisava atravessar outros olhares. Precisava de gente.

Lembro dos Overpontos, das votações, da espera. Quando um texto entrava em circulação, começava uma batalha silenciosa: ler outros autores, comentar, trocar atenção. Não por estratégia, mas por pertencimento. Eu lia muito. Comentava muito. E era lido por pessoas que levavam a palavra a sério. Textos lindíssimos. Vozes diversas. Escrita viva.

Ali eu aprendi algo que nunca mais esqueci: escrever é sustentar o retorno. O comentário não era um detalhe, era continuação do texto. Muitas vezes, só compreendi o que havia escrito depois de ler o que alguém me devolvia. Aquilo era escuta. Aquilo era formação.

Costumo dizer que sou cria do Overmundo porque foi ali que minha escrita ganhou corpo social. Não precisei me nomear poeta. Bastava escrever. Havia alguém do outro lado tentando entender. Isso bastava.

Quando você perdeu o incentivo que o mantinha vivo, não foi só uma plataforma que acabou. Foi uma dinâmica inteira de encontro. O rito da publicação, a troca constante, a leitura implicada — tudo isso se dissolveu. E com isso se perdeu algo que ainda hoje faz falta: o espaço onde a escrita encontrava resposta.

Já se passaram muitos anos desde aquele 20 de agosto de 2007. Meus textos continuam lá. Os comentários também. O site segue de pé, mesmo capenga, com textos truncados, como um arquivo que resiste. E isso, curiosamente, ainda é suficiente para manter viva aquela história.

Hoje, quando publico um texto e recebo apenas uma visualização silenciosa, entendo melhor o que perdi. Não é alcance. É leitura. Não é número. É comentário. Não é visibilidade. É presença.

Você me ensinou que escrever só faz sentido quando alguém atravessa o texto comigo. Talvez por isso ainda doa. Porque foi real. Porque existiu. Porque me formou.

Escrevo esta carta como desabafo, mas também como gratidão. E confesso: sigo escrevendo, em algum lugar, ainda à espera daquele tipo de escuta.

Com afeto e saudade,

Wanderlei