Marina Pinto

Meu Velho Fone de Ouvido

Certa vez, comprei um fone de ouvido.

Ele era lindo, confortável

tocava as músicas tão bem,

era tudo o que eu queria.

Esteve sempre comigo,

durante meus momentos de alegria

paixão, tristeza, melancolia.

Ah, meu fone de ouvido...

Ele era meu melhor amigo.

 

Mas o tempo foi passando...

depois de algumas quedas,

algumas falhas, 

já não tocava as músicas tão bem.

Certas melodias 

vinham associadas a ruídos,

dos quais eu já sabia de cor

em que versos começavam.

Evitei ouvir certas músicas

porque sabia que os ruídos,

com o tempo, 

me machucariam.

 

Certo dia, após uma queda,

meu fone de ouvido quebrou.

Ainda tocava músicas, 

ainda me fazia feliz.

Mas ele estava quebrado,

eu podia ver seu interior,

sua placa cheia de conexões,

pequenos botões de metal.

A qualquer momento,

ele poderia me machucar.

 

Então, comprei outro fone de ouvido.

Ah, esse sim! 

Tocava as músicas lindamente.

Aquelas melodias que passara a evitar,

eu podia ouvi-las com prazer, sem me machucar.

Meu novo fone não estava quebrado,

pronto para me fazer feliz 

com as mais belas músicas de amor.

 

Mas o meu velho fone ainda funcionava.

Guardei-o em minha gaveta,

caso algo acontecesse com o novo,

eu precisaria dele.

 

Mas, porque?

Tossindo para tocar as músicas, 

arrastando as letras

em forma de dolorosos ruídos,

expondo seu interior mais sensível a mim,

implorando para que eu o deixasse...

 

É, tem razão.

Às vezes, o melhor é deixar ir.

A qualquer momento, 

meu fone poderia me machucar,

provocar-me surdez 

ou dores de cabeça

ou causar-me um choque 

ou... sei lá.

 

Só sei que, apesar de toda a dor 

que ele sentia para me fazer feliz,

eu amava o meu velho fone de ouvido.