Ultracrepidário

Hemolinfa

Onde estão aqueles dias?
Aqueles dias onde tudo fazia sentido
Aqueles dias onde a chuva caia
E eu não precisava de mais que isso
Para sorrir.

Onde estão aquelas noites?
Aquelas noites onde cada estrela brilhava
Aquelas noites onde os grilhos estridulavam
E não precisava de mais que isso
Para ouvir.

Onde está aquela mente?
Mente que via mais que os olhos
Mente que peneirava cada detalhe da vida
Para juntar o ouro diáfano que vaga no vento.

Onde está aquele sangue?
Deve ter fugido há muito tempo
Com medo de coagular nos meus vasos
Com medo de secar nas minhas mãos
Com medo de ser digerido no meu estômago.

Agora o que tenho é hemolinfa
Densa
Azulada
Fria
Que não vaga em veias
Que não tem direção
Que dilacera
Lentamente
Os dias
As noites
A mente
E me faz ártropode
Que não entende nada
Que não sente nada
Que só come
Quando sente fome.