Ultracrepidário

Aquela Beleza

Houve um dia
Que eu sabia ver a beleza
A beleza soalheira do novo orvalho
A beleza cheirada no perfume do café
Ou até a beleza sombria do ônibus vazio.

Como pude perder essa beleza?
Como pude deixar de vê-la?
Vê-la nos castelos de nuvens
Que se desfazem deslizando no Azul
Vê-la no laranja do Sol
Que devora o céu do fim da tarde
Ou vê-la nas frestas dos rochedos 
Que escondem a penumbra dos insetos frios.


Pergunto-me onde ela está?
Será nas infinitas letras dos papéis recém-impressos?
Será embaixo desse travesseiro que abriga os vagalhões de meus sonhos?
Ou será nos sulcos rasos de meu cérebro mastigado pelos dias bravios?
Não.
Não está em nenhum desses lugares.

Abatido em cansaço, desisto de buscá-la.
O que resta é abraçar o cinza morno que rodeia meu peito.
Até que,
Nesses seus olhos escuros como a noite,
Brilham estrelas
Que riscam em minha fóvea
Essa tal beleza que se perdeu.